Notícias Palmeiras

Em depoimento exclusivo, Turra lembra bastidores do título Brasileiro e chegada ao Palmeiras

O técnico Felipão e o O auxiliar técnico Paulo Turra (E), da SE Palmeiras, em jogo contra a equipe do América FC, durante partida valida pela décima sétima rodada, do Campeonato Brasileiro, Série A, no Estádio Independência.
O técnico Felipão e o O auxiliar técnico Paulo Turra (E), da SE Palmeiras, em jogo contra a equipe do América FC, durante partida valida pela décima sétima rodada, do Campeonato Brasileiro, Série A, no Estádio Independência.

Foto: Cesar Greco/Ag. Palmeiras/Divulgação

Eu tenho muita gratidão pelo Felipão.

Era madrugada. Eu tive um sonho completamente maluco. Sonhei que tinha recebido um e-mail do professor Luiz Felipe. Ele me convidava para trabalhar no Guangzhou, da China. Quando acordei, no meio do sono, liguei meu computador e era verdade. Tinha um e-mail do Felipão.

Na época eu estava passando uns dias em Portugal, mas treinava o Cianorte, do Paraná. Acredito muito em espiritualidade. Em alguma força extra, em destino, em luz. Abria uma vaga na comissão técnica e ele disse: você é a prioridade.

A gente sempre se falava por e-mail. É um tipo de contato mais oficial, mais forte. O professor foi meu técnico no Palmeiras. Ele já tinha me escolhido em 2000. Na verdade foi o Murtosa quem me trouxe pra São Paulo, naquele momento. Ele que foi me ver em Caxias. O tempo passou e a gente voltou a se encontrar no outro lado do mundo. E eu iria ser um dos parceiros do Felipão. Tipo o Murtosa.

A vida é maluca. Dá várias voltas.

Por isso eu falo: acredito muito nessa coisa de espiritualidade. Desde então eu me empenho a ajudar o professor. O professor foi muito importante na minha carreira e minha busca é seguir seus passos. O jeito de lidar com as pessoas, os abraços nos jogadores, as conversas reservadas. O conhecimento tático e de treinamento. Não é por acaso que chamam ele de paizão.

O meu pai morreu em 2009. Eu era o treinador do Novo Hamburgo. O supervisor do clube me chamou no ônibus e disse: “Paulo, seu pai acabou de morrer”. Eu engoli o choro. E o supervisor disse que, se eu quisesse, poderia ir ao enterro e não comandar o time no próximo jogo.

Eu não aceitei. Fui trabalhar mesmo assim. Fiquei no banco. Meu pai sempre teve muito orgulho de mim e não gostaria que eu saísse dali.

Eu acredito que meu pai está sempre ao meu lado. Inclusive acho que ele tem participação naquele e-mail do Felipão. Ele deve ter atiçado o professor, dado ideia, pedido para lembrar de mim. Sei lá. E vai saber se foi ele quem veio me avisar para acordar logo e ligar o computador naquela madrugada? Deve ter feito festa lá em cima. Alguma coisa existe. A gente não veio pra cá em um estalar de dedos.

Em 2018, depois que saímos da China, o Felipão me ligou. Ele estava em Portugal e falou: “Ó. Acertei com o Palmeiras. Tem de se apresentar lá amanhã cedo. Toquem as coisas – eu e o Carlão Pracidelli – por uma semana até eu poder sair daqui e assumir o time.”

Eu estava em Itapema, Santa Catarina, com meu sobrinho. Não deu tempo de tomar água, cervejinha, nada. No dia seguinte fui para o aeroporto, cedo. Tinha de voltar para a Academia de Futebol depois de 17 anos.

Meu pai tinha muito orgulho de ter um filho jogando pelo Palmeiras. Mas ele era tímido, fechado, não falava muito para os outros sobre isso. Mas sempre teve muito orgulho de mim. Assim como tenho dele: um agricultor que trabalhava demais. Eu mesmo fui agricultor até meus 15 anos. Até me dedicar ao futebol.

Eu e o Pracidelli fizemos dois treinos com o elenco do Palmeiras e tinha jogo contra o Bahia. Copa do Brasil. O professor ainda estava em Portugal resolvendo algumas coisas pessoais. Nós treinaríamos o time. Estava todo mundo esperando para ver como o grupo reagiria com a nova comissão técnica. E, na estreia, não seria o Felipão no banco.

De repente eu e Carlão éramos o Felipão naquele momento.

Nosso time ganhou corpo. Vários jogos sem perder. Melhor ataque, melhor defesa, equipe que mais ganhou fora de casa. O título se aproximava. É natural que a ansiedade também se aproximou.

24 de novembro de 2018.

Saímos do CT do Palmeiras para embarcar rumo ao Rio de Janeiro. Do nada, vejo o elenco inteiro reunido. Os jogadores pediram para tirar uma foto. Todo mundo junto. Esse momento foi muito marcante. Nós nos abraçamos e tiramos a foto. Não é questão de soberba ou algo parecido, mas sabíamos que venceríamos o Vasco.

Faríamos jus ao hino: o Palmeiras – de fato – seria campeão.

Na saída do centro de treinamento, outro susto. Milhares de torcedores. O ônibus saiu e eles gritavam e batiam nas janelas. O corpo arrepiou. Deveria ser um sinal do meu pai. A torcida que canta e vibra também ganha jogos.

25 de novembro de 2018.

O dia da final. Momentos antes do jogo. O Felipão reuniu os jogadores.

  • Nós não vamos deixar escapar essa invencibilidade de jeito nenhum. Nós não vamos transferir o nosso título para o próximo jogo. Nós vamos vencer hoje.

Se o Palmeiras vencesse o Vasco, seria campeão brasileiro. Precisava ganhar.

O time que mais venceu fora de casa precisava ganhar em São Januário.

Dudu recebe e lança Willian. Willian Bigode cruza e Deyverson marca. 1×0.

Quando colocamos o Deyverson pra jogar, lá quando assumimos, fomos muito criticados. Mas ele foi fundamental no nosso trabalho. Deyverson fez 10 gols no campeonato.

O juiz apita. Acabou o jogo. Acabou o Brasileiro. Começou nossa festa.

Eu queria que meu pai tivesse visto. Queria que meu pai tivesse visto que o filho dele era campeão do país. Que o filho dele está ao lado do Felipão. Meu pai vibrou com o professor em 2002, assim como o país inteiro. Hoje vibraria com ele e com o próprio filho.

Teria orgulho da minha amizade com o Carlos Pracidelli e com o Murtosa.

Queria que meu pai soubesse que o filho dele ganhou. O Palmeiras foi um acerto na nossa vida.

Queria que meu pai tivesse viajado pela primeira vez de avião. Ele morria de medo.

Mas deveria estar na volta do Rio para São Paulo. Teve turbulência de tanta festa.

Eu fiquei arrepiado no grito da torcida, no gol, no apito final, na preleção do professor.

Talvez esse arrepio tenha nome. Talvez tenha sido meu pai me abraçando. Dizendo que estava ali.

Me perguntam se vou seguir carreira de técnico agora e eu respondo: não.

Vou seguir o meu "paizão" na carreira.

Tendo a certeza de que meu pai está me seguindo sempre.