Foto: Cesar Greco
Oi, Palmeiras.
É estranho. Você está em todos os lugares da minha casa. Está no símbolo, nas camisas, nos desenhos, nos livros. Está no quadro. No meu computador, no celular, no carro. Está espalhado por todos os lados. Mas eu sei que não posso te ver. Também sei que é por um bom motivo.
Eu sei que não posso te ver, mas senti saudade. Saudade do narrador anunciando Fernando Prass como último cobrador. Saudade de ficar com o coração na boca quando nosso goleiro foi bater. Saudade de perder a voz e a razão com você. Saudade do dia seguinte daquela final. Eu fazia o boletim de esportes na Rádio Globo. Passei a madrugada toda bebendo. Acordei sem conseguir falar.
Acordar sem voz não é uma boa ideia para quem sempre trabalhou em rádio.
O Laércio Maciel me chamou. "Boa tarde, Cimatti. Quais sãos os destaques do esporte?". Eu fiquei batendo na mesa e terminando com a frase: é o melhor goleiro do Brasil, Fernando Prass. O batuque, claro, substituía o palavrão. O fiapo de voz que sobrou repetia a frase o tempo todo. Até que o Laércio falou tchau.
Não posso te ver, Palmeiras. Mas só por enquanto. A Rádio Globo acabou. Só queria agradecer. Lá comecei a trabalhar com esportes. Lá quase vi você cair em 2014. Lá passei o ano todo apertado. Lá cobri o seu primeiro treino na nossa casa.
Hoje, na Rádio Bandeirantes, peço para todos ficarem em casa. Só assim a gente vai se ver logo outra vez. Mas minha casa também é a nossa arena. É estranho não estar presente.
Senti saudade hoje, quando li o texto da minha amiga jornalista Fernanda Martinelli, contando bastidores da final de 99. Texto emocionante. Emocionante como o nosso time. Como você.
Eu sei que não posso te ver, mas bateu saudade de Zapata chutando. Euller arrancando. Oséas arriscando sem ângulo. Paulo Nunes provocando. Marcos salvando.
Estou com saudade do Marcão. Que outro dia eu critiquei aqui. Mas sabe como é: família é família. A gente briga e não concorda, mas continua amando. Eu fui o Marcos durante toda minha infância na escola. Gritava o nome dele em cada pênalti nos intervalos das aula. O nome dele ajudou a me fazer gente. A me moldar como gente. E só posso agradecer.
Agradecer pelo pulo quando Marcelinho chutou. Pelos milagres quando o River bombardeou. Quando a Alemanha tentou tirar o título do Brasil.
Sabe, Palmeiras.
Eu sei que a gente não pode se ver, mas queria te dizer que tenho visto jogos antigos, camisas antigas, posters antigos. E me vejo em cada lembrança sua.
Vejo a criança que chorou quando Evair desempatou. Quando Júnior Baiano fez o pênalti. Quando Felipão abraçou os gandulas.
Vejo o adolescente triste com a derrota para o Sport em 2007. O último jogo com meu pai no estádio.
Vejo o homem que abraçou o avô quando o Betinho desviou. O avô que se despediria um ano depois.
Palmeiras, eu sei que é estranho.
É estranho não saber quando o portão vai reabrir. A rua vai reabrir. A bilheteria vai reabrir. Quando o juiz vai apitar.
Palmeiras,
Tenho te visto em jogos antigos. Torcendo de novo. Chorando de novo. Pulando de novo.
Desvio a tristeza pensando em você.
Faz tempo que a gente não se encontra, mas meu orgulho é enorme por ver que você não se desencontra com sua história.
Meu time sabe que dinheiro não é tudo.
Meu time não força a volta, não demite, não corta.
Meu time quer a família toda cantando e vibrando. Com saúde.
Meu time transforma a lealdade em padrão.