Notícias Palmeiras

Saudosa maloca

Saudosa maloca

Saudoso Palestra!

Allianz Parque querido, onde Mario e Victor passaram momentos maravilhosos de criança na estreia do Brasileirão de 2016.

– As traves são tão pequenas pela televisão… Aqui no estádio é tão grande!

Mario nunca tinha estado no Allianz Parque. E em campo algum. Quase tanto quanto ele gritou “Palmeiras” como faz a vida toda desde Ilhéus, quase tanto quanto berrou “gol” nos quatro que poderiam ser mais na estreia no Brasileiro de 2016 contra o Atlético campeão paranaense.

Mario repetia sem parar a Victor Morelli Acquafreda:

– Realizei um sonho. Realizei um sonho!

Mario é Palmeiras como tantos. Mas poucos podem dizer que moram, se protegem, vivem e vestem o Palmeiras. Ele dorme as noites paulistanas abaixo de um viaduto na Radial Leste. Saiu de casa há tempos para ficar perto do trabalho, morando no barraco. A empresa de limpeza faliu. Sem emprego, sem como voltar a ter uma casinha, decorou o que ainda tem com bandeira, camisa, flâmula, faixa, o que tiver de verde e branco. O que puder de Palmeiras.

O barraco armado virou famoso nas redes sociais. Não tem palmeirense que não passe por lá e não se sensibilize. Morador da Mooca, a três quarteirões do barraco, Victor, 38 anos, todo dia sente ali que o amor é verde. Quando o filho dele disse que não poderia ir na estreia do BR-16 contra o Atlético, Victor foi procurar o palmeirense do barraco. Quando chegou havia vários amigos de Mario. Ele se apresentou e o convidou a ter um programa inédito naquela tarde de sábado.

– É o sonho dele!!!

Os amigos dele responderam pelo baiano palmeirense. Ele topou na hora.

14h30. Mas ficou meio assim… Dois torcedores haviam combinado com ele outras vezes e não apareceram… Mas Deus dá o frio conforme o cobertor. Já disse o Joca para o amigo Mato Grosso da “Saudosa Maloca” de Adoniran Barbosa.

14h30! Vestido com a camisa comemorativa do Palmeiras da Libertadores de 1999, Mario fez o passeio dos sonhos quando entrou no carro de Victor. E aquela cara que você também fez na primeira vez em campo. E mais ainda quando esse é a nova casa palmeirense. E ainda mais para o Mario que só tem um comprovante de endereço: Rua Palestra Italia, 1840.

Mario virou criança. E viu tudo ficar maior. Para quem sabe dos apertos do bolso e do tamanho dos becos e bocas que ele enfrenta, ali era o Universo.

As traves agora com redes brancas e verdes eram maiores do que ele imaginava. Por tudo também que o palmeirense sofreu neste século, normal pensar isso. Teve jogo e campeonato que o nosso gol parecia um latifúndio e a meta rival, um gol-caixote. Lá da casinha de caixas e pedaços de madeira do Mario, as metas pareciam mesmo menores. Aquelas bolas não entravam nas redes alheias. Agora, parece outra história. Ou a de sempre do Palmeiras. Quatro gols na estreia. Um futebol do tamanho do clube. Uma meta grande como os objetivos palmeirenses.

Mario como criança celebrando os gols. Victor comentando com Mario que ele era pé-quente, trouxera sorte ao time, em grande atuação para um primeiro jogo. E Mario abraçando o novo amigo e quem estivesse perto como se fosse a primeira vez. E era.

Quando voltou para debaixo do viaduto na noite fria de maio, realizado pelo sonho alviverde, disse a Victor que ele enfim já teria a resposta aos motoristas de ônibus que todo dia passam na frente do barraco e mexem com ele por causa da paixão que o veste, agasalha, conforta e o faz sobreviver sob o teto verde:

– Foi 4 a 0, fora o show! E eu estava lá!

O palco da paixão palmeirense também foi dele. Exatamente um século e um dia depois da estreia do Palestra no primeiro Paulista que disputou (empate por 1 a 1 com o Mackenzie, em 1916, no campo da Floresta que o Palestra Italia ajudou a melhorar com as arquibancadas desmontadas e trazidas do Velódromo), Mario estreou no Allianz Parque.

As metas são maiores do que a gente imagina. Mas elas são vencidas com amor e fé. Sempre pode ter um Victor ao lado. E uma vitória tão próxima quanto o calor do torcedor.

(Este texto faz parte do livro MEU NOME É ENEA, editado pela Onze Cultural, escrito por Bruno Elias e por Mauro Beting. Obra que, em 24 de dezembro de 2016, dei para o Mario na mesma casinha dindindonde ele celebrou os momentos felizes do eneacampeonato)