Era necessário tratar com distância. Não tinha o que fazer. Ou você optava por cuidar da saúde ou por cuidar de uma competição de dimensões estaduais. Ao longo do tempo, ouviu-se na televisão: ‘qual o motivo dos grandes clubes não utilizarem esses campeonatos como pré temporadas e só nas fases seguintes utilizarem os titulares?’, eu lembro bem. No ano mais claustrofóbico da história deste país, um gringo resolveu ouvir as sugestões e deu à fase de grupos do Paulistão o peso da fase de grupos do Paulistão: uma preparação.
Te faço, então, uma questão: seriam os titulares de um time 11 sujeitos totalmente incólumes às mudanças? 11 sujeitos definidos para todo o sempre? E imunes às necessidades de atuar? Quem sabe, talvez, estátuas de mármore que jamais podem entrar em campo? Ou seriam figuras que, quando disponíveis, deveriam ir à campo e honrarem seus contratos? Estariam eles sujeitos à validação midiática de um discurso criado pela própria ou estariam sujeitos aos analistas físicos e fisiológico de seu empregador? Eu desconfio que seja a segunda opção.
Se a imprensa permitir, é claro.
Parte dela parece querer um inimigo a qualquer custo. Fabrica seus demônios, os vestem de verde e lutam freneticamente para combatê-lo. ‘É um vexame cair na primeira fase’. ‘Deveriam ter caído na primeira fase’. ‘É um desrespeito escalar reservas’. ‘Não poderia usar titulares’. ‘Não tinha desistido do Paulistão?’. ‘Não pode perder o Paulistão’. Fica claro a vocês a incoerência? A mim, escancarada como um outdoor luminoso em Las Vegas Boulevad na testa de cada um desses sujeitos de competência muito duvidosa que falam tanto com base na raiva que parecem ter um estômago acima dos olhos.
O discurso mudou?
Imagine o cenário. Necessidade de dar folga ao grupo que mais atuou no MUNDO?, jogar quatro competições e ainda ter certa competitividade. Abel tinha de administrar folgas, incluindo a sua, afinal, há de se supor que a imprensa, ou parte dela, não trabalhe para todo sempre tal qual um relógio londrino, e que entenda essa obviedade. Tinha de jogar três decisões que compunham dois campeonatos, atuar bem em outras duas, nas quais é o atual campeão. Aparentemente, era melhor usar a base e o elenco de apoio do que praticar um lamentável W.O. Assim foi feito. E aí começou a ladainha da ‘vergonha’.
Jogar no Rio de Janeiro, pelo campeonato Paulista, às 22h? VERGONHA. Há MESES atuando de 48h em 48h? VERGONHA. Diante de tudo, a quinta campanha da competição, que classifica 8, foi lamentada profundamente por boa parte dos microfones. Prelúdio do evidente sucesso. Sabia-se que o Verde venceria o rival sem grandes problemas. Sabia-se que o São Paulo enfrentaria um time que desafiaria sua caminhada pelo título que tanto precisa. É nesse momento que a indiferença se distancia da competência. Houve indiferença à relevância da competição, que é irrelevante, mas nunca houve incompetência.
Uma camisa verde com P no peito não perde sequer par ou ímpar sem se incomodar.
O Palmeiras não precisa vencer o Paulistão. Sua torcida não tem quaisquer problemas a respeito disso. Ela vive boa fase de barriga satisfeita, ainda que sempre faminta. Mas o Palmeiras é competente e competitivo. Ele está habituado à festa. Ele quer vencer. Vá explicar ao Rony que ele deve ficar tranquilamente no banco de reservas em um Dérbi por conta da coerência de discurso de gente que prefere o impropério ao argumento. O Rony, o Luiz, nós e o Abel queremos que vocês se danem. Basta o Palmeiras ao palmeirense.
A competência nunca deveria ser motivo de sofreguidão.
O discurso e as ações são incontestavelmente coerentes. Tudo pela vitória. Poupar? Pra ganhar. Usar garotos? Pra ganhar. Os experientes? Pra ganhar. Na Libertadores? Pra ganhar. Na Flórida Cup? Pra ganhar. Na enquete da luz do Maracanã? Pra ganhar, também. A necessidade impôs escalações diversas. O desespero por respiro, a ambição pelo tempo de treino. Acima de tudo, eles e nós somos obcecados por ganhar. E municiados com trabalho e nomes para tal, não há outra opção. Doa, e dói muito, a quem doer:
O Palmeiras só quer vencer.