A coragem de Stefany Krebs

Surda, talentosa e quebrando barreiras, a atleta que destruiu os paradigmas

Sempre quando perguntam um momento bonito no qual estive trabalhando com o esporte, eu sempre respondo o mesmo para todas pessoas: o dia em que a Stefany Krebs foi apresentada no Allianz Parque.

Eu simplesmente olhei para trás e aproximadamente duas mil pessoas presentes estavam batendo palma, posicionando a mão para o alto e girando, usando a Língua de Sinais Brasileira – libras, para ela. Naquele momento, eu me emocionei, tive que parar de gravar e só pude sentir o momento.

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O mesmo aconteceu no último sábado (29), quando a Tefy, como é conhecida, estreou oficialmente pelo time alviverde. Ela é a primeira jogadora surda que o futebol feminino profissional brasileiro teve.

“Quando cheguei, no começo do ano, foi tudo novo para mim. Precisei me adaptar, e não só na questão da comunicação. Também precisei me adaptar às meninas, pois todas são de alto nível e experientes no campo, então fui aprendendo, prestando atenção em tudo que a comissão técnica e as atletas fazem nos treinos e sempre tive muita paciência para aprender e evoluir em cada dia”, explicou Tefy.

Krebs proporciona para o jornalismo e o futebol muitos momentos históricos. Mesmo que seu tempo dentro de campo tenha sido pequeno, foi o necessário para marcar.

“Foi tempo suficiente para sentir muita gratidão e felicidade pela oportunidade de estrear e ainda poder representar a inclusão da comunidade surda”, comentou a atleta. 

Não sei se Tefy tem noção da grandeza dela, mas a torcida tem! Quem vai ver o futebol feminino em Vinhedo e tem a oportunidade de conhecê-la sabe do que falo. Tefy tem um amor e uma maneira para nos ensinar completamente incríveis.

A relação dela com os torcedores e jornalista é algo sensacional, mexe com o coração. Stefany é muito mais do que uma jogadora dentro de campo, ela abre caminho para novas possibilidades, inspira outras pessoas.

“Acredito que decidi me testar, testar a minha coragem e tirar as dúvidas que eu tinha sobre a minha surdez, se ela atrapalhava ou não e, com o tempo, fui descobrindo as respostas. Acredito que consigo mostrar o potencial que a comunidade surda tem, todos têm capacidade de fazer algo. Sempre ‘esqueço’ que sou surda quando jogo bola, então percebi que a audição não atrapalha na minha vida”, disse.

O outro lado dessa história

Como todas as histórias, essa também tem dois lados e um deles é a dificuldade dentro de campo. Tefy havia entrado em campo em um jogo não oficial, um amistoso contra o Juventus, da Mooca, no início do ano. 

O que dava para perceber era que a arbitragem da partida, infelizmente, não estava preparada para recebê-la naquele momento. O técnico Ricardo Belli e as atletas precisavam fazer gestos para ajudar, pois o árbitro aparentava estar um pouco perdido.

Na última partida, durante a qual Tefy estreou oficialmente, o NOSSO PALESTRA questionou a ela sobre a arbitragem. “Creio que seja bem tranquilo e que não vai atrapalhar ninguém. Também imagino que seja um começo para a arbitragem, mas, com certeza, eles estarão cada vez mais preparados”, contou. 

Ricardo Belli falou também sobre o momento: “Ela trabalha bastante e tem um comprometimento grande com a equipe. Stefany é muito importante para nós e, assim como as demais, merece oportunidades. Devido à quantidade de jogos nas duas competições que teremos pela frente, é muito importante que todo elenco esteja pronto para jogar”.

Stefany tem uma boa relação com suas companheiras de time, dentro e fora do campo.

“Elas me auxiliam bastante e tentam se comunicar comigo para me explicar sobre tática, jogadas e alguns trabalhos no campo. Gosto muito de ver que elas me ajudam, como falei, elas são experientes no campo, então quero aprender e evoluir”.

Como é no Palmeiras?

Stefany chegou no Palmeiras conhecendo o preparador Willian Bittercourt, ele havia trabalhado com ela na Seleção Brasileira de surdos. Na apresentação, o Palmeiras contratou um interprete para melhorar a comunicação com a jogadora e sua mãe também estava presente. Entretanto, as coisas não continuaram assim.

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Vejo as fotos que me deixa sem palavras para dizer, só no momento quero agradecer a Deus, sem Ele e não sou nada, a minha família pelo apoio, pela motivação, por estar comigo todos os dias mesmo a distância (estou morrendo de saudades já), força principalmente a minha rainha viajou umas 16 horas até São Paulo para ver a minha apresentação, foi muito emocionante, na hora ela me entregou a camisa do Palmeiras, caiu as minhas lágrimas, fiquei lembrando muitas coisas que foram dificuldades, até agora temos dificuldades ainda, só não podemos desistir, jamais! Obrigada Preparador Físico @william_bitencourt_ por acreditar em mim, por querer me ver crescer muito, por trabalhar comigo faz anos e por me ajudar muito, a time do @femininopalmeiras maravilhosa, aos meus amigos e torcedores pelas mensagens positivas, motivadas e por tudo!!!! Meu sonho de ser jogadora profissional desde a infância, foi tudo no tempo de Deus, quem sonha, lute.. Lute.. Lute.. Não desistem dos seus sonhos, acreditem sempre, no começo vai ser muito difícil, mas pensem no final como vai ser. Estou aqui, representando para toda comunidade surda com muito orgulho. Somos capazes de tudo, nada é impossível. Quebrem a barreira!! MUITO OBRIGADA!! Que Deus abençoe vocês sempre. Torço muito para os outros clubes seguem o exemplo da Palmeiras, é muito importante fazer inclusão verdadeira, parabéns @femininopalmeiras mais uma vez e o diretor @albertosimao por falar em Libras "bem vinda, Palmeiras". #DeusNoComandoSempre #HumildeSempre #ASDJ #seguimosfirmes #SejaAVontadeDeDeus #avantipaleatrinas 💚🐷🙏🏽⚽

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No dia a dia, a jogadora não possui nenhum profissional, seja interprete ou professor de Libras, para auxiliá-la. Stefany tem uma ajuda da comissão e das atletas. Como ela sempre diz, estão aprendendo todos juntos.

O interprete de Libras é completamente importante para a atleta conseguir acompanhar os treinamentos, pegar as partes técnicas e táticas.

Essa falta de auxílio é muito comum. Quando atuava no Barateiro Futsal, Stefany enfrentou dificuldades. A comunicação em Libras com os profissionais era zero e ela não conseguiu se adaptar ao time. Em um dos casos, a coordenadora do time impediu que uma atleta explicasse para Tefy o que estavam falando.

Sua história com o esporte

A trajetória de Tefy começou no futsal. Ela atuou por algumas equipes, entre elas, o EC Pelotas. Em 2017, conquistaram o bronze nas Surdolimpíadas.

No ano de 2015, com apenas 17 anos, Tefy foi eleita a melhor jogadora do Mundial de Futsal de surdos. Seu último feito de 2019 foi o campeonato mundial com a Seleção Brasileira de Futsal para surdos, sendo eleita a melhor jogadora, novamente.

Stefany Krebs já chegou a treinar no campo, também. Ela já treinou com o time de campo do Internacional. Chegando no Palmeiras em 2020, a meio-campista irá guardar sempre a parte positiva disso tudo.

“Gostaria de agradecer às atletas pela paciência e pelo esforço em poder me auxiliar. Estou percebendo que estou seguindo o caminho certo, com o tempo de Deus e a vontade dele. Só tenho a agradecer a todos do Palmeiras, a diretoria, as atletas e, em especial, a comissão técnica (Ricardo, Vanessa, Michel e William). Eles me ajudam bastante nos treinos e me explicam 30 minutos antes de começar o que vamos trabalhar no dia. É um ótimo tempo para tirar dúvidas e fica muito melhor para mim. Só agradeço por acreditarem em mim e na minha capacidade. É um passo de cada vez “.