André Galassi: ‘Família Palmeiras e o espelho que não quebra’

Relato de um jornalista que tem o amor ao Verdão passado de geração para geração

O dia 6 de dezembro se tornou histórico para os torcedores do Palmeiras. O empate por 1 a 1 diante do Cruzeiro garantiu a 12ª conquista de Campeonato Brasileiro para o clube, que agora é o maior vencedor da competição em qualquer contagem, seja na conta unificada, na matemática pós-1971, no século ou nos pontos corridos.

Para mim, jornalista que hoje sou graças ao Palmeiras, esse jogo transcendeu a profissão ou a paixão pelo clube. É necessário, nestes três anos de trabalho no Nosso Palestra, diferenciar o lado torcedor com o jornalístico. Ontem, um terceiro elemento foi acrescentado: o emocional. Pela primeira vez, vivenciei um capitão palmeirense erguer um troféu sem que eu esteja ao lado do meu pai.

José Luis Rocha é o responsável da minha paixão pelo Palmeiras, e consequentemente, por eu estar aqui no Nosso Palestra escrevendo esse relato na madrugada do título. Pela profissão que escolhi seguir, estamos hoje a centenas de quilômetros de distância. Ao mesmo tempo, a distância física entre nós parecia diminuir a cada grito de gol durante o campeonato, a cada partida assistida pelas TV’s separadas. Ele, que plantou em mim o amor pelo alviverde, agora esteve mais próximo do que nunca, mesmo que fisicamente distante.

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Endrick fala no Prêmio ESPN Bola de Prata

Ao passo que íamos trocando mensagens durante todo o dia que antecedeu o jogo diante do Cruzeiro, ansiosos pelo prélio que aguardávamos, a cidade de Belo Horizonte, palco da batalha final, estava ansiosa para testemunhar o desfecho do Brasileirão. Cerca de três mil torcedores palestrinos estiveram na cidade para acompanhar a equipe no último jogo do ano.

Bem verdade que o título já estava (quase) decidido, mas o jogo se desenrolava tenso. Cada passe, cada defesa, cada ataque era um suspiro diferente. E então, o momento de maior êxtase aconteceu. Endrick, sempre ele. Um gol, um grito abafado pela distância que nos separava, mas que parecia estar do meu lado. Ali, aos 21 do primeiro tempo, fomos campeões brasileiros.

Palmeiras 1, Cruzeiro 0. O título estava ali, ao alcance das mãos. Naquele instante, eu senti uma conexão única com meu pai, como se o abismo que nos separava fosse preenchido pela alegria compartilhada, pela herança de um sentimento que ultrapassa barreiras geográficas. Dos ancestrais italianos, passado para a geração dos avós, a sua e a minha.

Não à toa após o apito de Anderson Daronco, com o 1 a 1 no placar e já em ligação por vídeo com meu pai, me lembrei da música “Espelho”, de João Nogueira, que sempre teve um lugar especial no meu coração e na relação entre eu e meu pai. “Meu medo maior é o espelho se quebrar”. A letra parece descrever cada título do Palmeiras que convivemos juntos. Neste, mesmo à distância, via meu pai refletido na alegria que transbordava de mim. A saudade se fazia presente, mas era suavizada pela certeza de que estávamos conectados por algo mais poderoso do que a distância física.

Esse título não é apenas do Palmeiras, é de todos os torcedores, é nosso. Meu, do meu pai e todos os espelhos antepassados que não se quebraram. A vitória não foi apenas sobre o adversário em campo, mas sobre as barreiras geográficas que distanciam tantas famílias de palmeirenses. Pais e filhos, mães e filhas, pais e filhas e mães com filhos – não há gênero no espelho que é a ancestralidade palmeirense.

Eu e meu pai, somos , mais do que nunca, uma família Palmeiras, unida pela paixão que transcende o tempo e o espaço. Assim, por telefone, celebramos não apenas a conquista do título, mas a vitória sobre a saudade, à distância e a separação. Palmeiras campeão, meu pai presente comigo de uma maneira, mas que deverá ser cada vez mais constante, e a melodia de ‘Espelho’ ecoando como um hino eterno em nossa relação.

Obrigado, Palmeiras. Obrigado, pai. O espelho jamais se quebrou.