De lágrima a lágrima

A lágrima é a gota mais pesada do mundo. O peso de um sentimento expurgado é maior que qualquer chumbo derretido. A densidade de um choro genuíno afunda em qualquer líquido. Apesar de singular na forma, é versátil no sentido. Expressão das dores e alegrias mais profundas. Lágrimas.

Escrito por Artur Abramo

A lágrima é a gota mais pesada do mundo. O peso de um sentimento expurgado é maior que qualquer chumbo derretido. A densidade de um choro genuíno afunda em qualquer líquido. Apesar de singular na forma, é versátil no sentido. Expressão das dores e alegrias mais profundas. Lágrimas. 

Conheça o canal do Nosso Palestra no Youtube! Clique aqui.
Siga o Nosso Palestra no Twitter e no Instagram / Ouça o NPCast

Minha primeira lágrima com o Palmeiras foi em 2012, meses depois de comemorar, pela primeira vez, um título com essa camisa. Chorei na escola, por causa da segunda queda. Estava no 4° ano escolar e no 1° como palmeirense. Chorava, porque amava. Aprendi a amar meu time na adversidade. Não seria diferente para quem teve o ano de nascimento carimbado com o primeiro descenso. Nasci chorando. Lágrimas. 

Logo de cara, os motivos para largar de mão estavam todos na mesa. Deixar pra lá aquele time que eu mal conhecia e já me fazia sofrer. Porém, o Palestra que nos ensina, fez do Palmeiras a minha sina. Não quis saber. Assisti a quase todos os jogos daquele lamurioso campeonato. Mantive a fé a milhão na Libertadores até o fatídico jogo. Quando não passava na TV, ouvia no rádio pelo computador. Não arredei o pé. Subimos. Lágrimas. 

No ano seguinte, esperança. A cor que veste o verde ameaçou sorrir para mim. Superestimava a qualidade do time e desconhecia os limites da crença. Tudo justificado pelo roteiro de retorno triunfal no ano do Centenário. Pela lógica, não foi o que aconteceu. Derrotas humilhantes, fracassos em clássicos e festa estragada na inauguração do novíssimo estádio. Ainda assim, o fim foi prazeroso. O alívio da salvação. Sentimento colossal que solidificou a religião alviverde dentro de mim. Estamos vivos. Lágrimas. 

Começou o ano da redenção. Patrocínio, contratações, parceiros e estádio novo. Final do Paulistão. É hora de voltar a sorrir! Não foi. Desabei a chorar mais uma vez, quis me esconder. Não entendia a injustiça de mais uma derrota. Levantei aos poucos e fui retomando o credo naquele time. Assisti estupefato a todas as vitórias naquela Copa do Brasil. Na final, a convicção já havia retornado ao seu lugar. Não me importei com a primeira derrota, porque tinha certeza que seríamos. Fomos! Lágrimas. 

Daí pra frente, as coisas mudaram. Pude comemorar mais duas vezes o Verdão conquistando o Brasil. Agora, em campanhas mais longas e persistentes. Um time que precisou ganhar muito para enfim ganhar. Saímos da fila, falhamos e vencemos de novo. Uma fila que não me pertencia como torcedor. Pouco sentia o peso daqueles 22 anos. Contudo, o choro de desafogo de milhares passou o bastão para quem ainda começava sua jornada com o Maior Campeão do Brasil. Lágrimas. 

Entre as vitórias, não deixaram de existir as derrotas. Algumas mais dolorosas, outras menos. Sofri e segui. Sorri e segui. Dois campeonatos ainda estavam no negativo conosco. O Paulistão e a Libertadores. Ambos nos foram tomados no ano do Deca. Me desiludi com as vitórias que pareciam próximas e, em milissegundos, se afastaram para o além. Imaginei que depois de tão longe chegar, não haveria outra vez. Outra oportunidade de nos provar Palmeiras. Lágrimas. 

Enfim 2020. No ano mais difícil da história moderna. Em meio a um caos humanitário. O mundo parou e o futebol também. Voltamos sendo derrotados. A sensação de impotência cresceu em mim. Todos os fantasmas pareciam determinados a voltar a nos atordoar. Foi aí que reescrevemos a história. Fizemos valer as cartas do destino. Exorcizamos quem nos perseguia. Avançamos mais uma etapa e demos o primeiro passo para o mais alto degrau. Um título estadual que, se não carregou expressividade, carregou alma. Alma e coração. Lágrimas. 

Aliviado com esse triunfo, esquecemos de olhar pra frente. Do êxtase do título que voltava a casa, para o medo no restante da temporada incerta. Desanimei-me com o futebol pobre. Chateei-me com as péssimas atuações. E aguardei que novos ares viessem. Eis que surge um sopro de glória. Um pré-destinado cruzou o Atlântico e se pôs defronte ao o nosso caminho, para nos amainar com sua sabedoria e obstinação. Me animei. Pois, se começou com a empolgação do desconhecido, terminou com a paixão àquele que fez questão de nos conhecer. Ele nos conduziu ao último capítulo da nossa única Obsessão. Fim de jogo. O Palmeiras está na final da Libertadores novamente. Lágrimas. 

As páginas estão sendo escritas. Atento, eu li cada uma com o coração na mão. A folha derradeira será assinada nas próximas horas. Que seja por aqueles que cantam por ela todos os jogos. A ansiedade, o medo, a confiança e a vontade visceral de vencer fundem-se em um só. Palmeiras. A eternidade aproxima-se. Quem muito penou por ti, merece te alcançar. É a hora. E ao final, podem cair… Lágrimas!

LEIA MAIS
O Lusíada: uma epopeia palmeirense, por João Sundfeld
Carta para mim mesmo, por Dimitrius
Palmeiras na veia, a grande alma verde, por Tayna Fiori