Diário de um detento

Sobrevivendo no inferno era o álbum daquele lançamento polêmico. Sobrevivendo no inferno era a realidade de Jocenir, o verdadeiro detento.

Sobrevivendo no inferno é andar contra a corrente nesse país que insiste em enterrar na goela alheia o que é conveniente.

Sobrevivendo no inferno é o prefácio do ‘Diário de um detento’, papo sério e consciente sobre a vida de quem tenta resistir, mesmo sem sucesso.

Mano Brown desenhou essas linhas ainda em 1997, pra berrar contra o mundo sobre as dores de uma prisão.

A gente usa de licença poética e agora usa pra contar sobre bola, um time, uma história e uma taça na mão.

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São Paulo, dia 1º de fevereiro de 2021
8h da manhã

Aqui estou mais um dia, sob o olhar sanguinário do.. jornalista? do cronista? do analista?

Você não sabe como é caminhar, ou treinar?, com a cabeça na mira de uma.. palavra? de uma HK de tinta azul ou microfone de lapela?

Metralhadora alemã ou de Israel, ou de São Paulo? ou do Rio? De qual estúdio? E qual redação? Estraçalha ladrão, e profissional, que nem papel.

Abel poderia falar em ritmo de prosa e lamúria sobre a rotina sufocante de seu trabalho, mas a fibra de luta não permite a raiva da missão.

Abel não fala, mas eu posso. É meu dever. Ele não é detento, mas que rotina épica e deslumbrante de ser desmerecido pelo simples motivo de vencer.

Abel Ferreira no Palmeiras (Foto: Cesar Greco/Palmeiras)

Ratatá, mais um metrô vai passar

Tic-tac, ainda é 9h40, o relógio anda em câmera lenta

Mas o passado não mente, ele expõe, comprova, prova, esfrega na cara. Foi o Cucabol, foi o Scolarismo, foi o Luxemburguismo. É o Abelismo.

Sufixo de Palestrinidade. Sinônimo de vitória. Antônimo de análise. Dicionário da maldade. Eles não querem a verdade.

Eles sabem o que eu desejo, sabem o que eu penso
O dia tá chuvoso, o clima tá tenso

Só não aqui, na família. Nos que sentem de verdade, que vivem com toda intensidade. Só não aqui, entre nós, os nossos, as nossas histórias.

A tristeza ou a alegria que tentam sentir por nós, viver por nós, falar por nós e reclamar por nós, nunca existiu. De factoide vieram. E agora, sentiu?

Mas eu conheço o sistema, meu irmão
Hã, aqui não tem santo

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Nunca teve. Não tem demônio, também. Nem nunca teve. Sobrou má vontade, sommelier de sentimento, eu só duvido do caráter.

Hoje, tá difícil, não saiu o sol
Hoje não tem visita, não tem futebol

Mas vai ter. Final, uma, duas, três, nacional, gringa, classificação, sucesso, grana, festa, glória, canto, torcida. E ainda dizem que isso é estar mal.

Aí, moleque, me diz, então: cê quer o quê?

Dignidade pra se colocar no lugar que quem sente. Hombridade de entender que quem cala, consente, compreende, pressente e entende.

Deixem o Palmeiras em paz. Ele é da sua gente.

Abel não é detento. Sua sentença é o amor. Sua punição é a eternidade. Falem o que quiserem, ele não vai ouvir. Ele tem nosso carinho pra sentir.

Deixem o Palmeiras pra nós. Estamos exaustos, felizes e em paz.

Hoje e sempre.

São Paulo, dia 9 de fevereiro de 2021
8h da manhã
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