Eu sou Palmeiras, sim, senhor

A história de um filho que não seguiu os pais e foi coroado com amor

Antes de mais nada, gostaria de deixar claro que entendo quem pensa diferente. Meus pais me ensinaram isso. Ensinaram, desde o primeiro instante, o valor da liberdade. Ensinaram que, com ela, a pluralidade é possível e a responsabilidade é necessária. Decidir por si só, dentro dos limites do contexto, sempre foi o lema. 

Foi a partir dessa base que edifiquei minhas primeiras crenças. Nascido em uma família ateísta, a religião nunca me chamou a atenção. Agnóstico que me tornei, restou acreditar em futebol. Depois de abandonar o mundo dos dinossauros, mergulhei de cabeça no que viria a ser minha maior paixão. 

Filho de são paulino com corinthiana, meu senso de justiça e diplomacia só me deu uma escolha: não escolher nenhum. Imparcialidade singular. Meus pais bem que tentaram. Minha mãe, indiretamente, por meio do meu apego a minha vó e a alguns primos mais velhos; meu pai, diretamente, me levando a jogos do tricolor na casa de amigos. Tive camisa de ambos. 

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Tomei as rédeas e optei por contrariá-los. Influenciado por primos maternos, palmeirenses revolucionários, decidi esverdear meu destino. Dissidentes da doutrina alvinegra da família, a nova geração pintou-se de verde e branco. Isso em uma época que fazia pouco sentido ser porco. Um tempo depois, ainda puxei meus dois irmãos mais novos para o lado verde da força. 

Escolhido o time, diferenças à parte, sempre tive de conviver com um sentimento ambíguo. Naturalmente, a construção da rivalidade é um processo de socialização e carrega variáveis interpessoais. Não que isso tenha me feito torcer por Corinthians ou São Paulo, muito pelo contrário. Sempre fui muito apegado ao gosto especial de vencê-los ou de vê-los perder. Mas há momentos em que a vida se sobressai. 

Digo isso, porque perdi três corinthianos nos últimos três anos. Meu primo, minha vó e meu tio. Não tive a oportunidade de me despedir de nenhum. Mas pude compartilhar um último papo com um deles. Meu primo, Gabriel. O destino quis que a nossa última conversa por aqui fosse o tema principal da nossa amizade… futebol. Mais especificamente, debatemos sobre um Derby. O último dele. Sofri muito com aquela derrota, mas hoje meu coração enche de amor quando penso que ele partiu como viveu. Campeão. 

Digo isso, também, porque sentia que havia decepcionado meu pai por não ter seguido o mesmo caminho dele. Ouvi ele ser zombado por ter me deixado escolher e ser escolhido. Não mais. Não mais, porque vi ele se emocionar com o grito de Campeão da América dos três filhos. Não mais, porque percebi ele olhando o cair das lágrimas de um sonho realizado. Não mais, porque senti ele me abraçando com força, feliz pela minha felicidade. Não mais, porque sei que ele se orgulha de mim, não importa a cor que eu vista. 

O amor é maior que qualquer coisa. E o futebol também é feito de amor. É feito de pessoas que amam. E por isso, eu sei que eles não deixarão de me amar ainda que eu declare meu amor. Me amarão ainda que eu diga: Eu sou Palmeiras sim, senhor.

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