JG Falcade: ‘Memórias de uma taça marcada pela alma de quem torce’
Foi lá que notei, pela primeira vez na viagem, que havia um universo para vencermos: éramos minoria.
O texto pré Supercopa foi escrito na poltrona 22F do avião que me levava pra Brasilia. Este, que conta o pós, vem diretamente da 27C, no corredor. Ao meu lado, vai um novo amigo, que por incrível que pareça, conhecia meus textos. Algumas fileiras pra frente, outros dois amigos, todos nós unidos pelo Palmeiras e pelas loucuras que fazemos mundo afora. Nesta viagem, uma das maiores.
Rebobinemos a fita até sexta-feira. Quando cheguei a Brasília, vi alguns, não muitos, palmeirenses, mas membros daquela parcela engajada que tem um único foco: torcer. E posso valer com vocês o dinheiro que for necessário, eles todos achavam que era difícil ganhar, que a tendência era uma jornada pouco feliz, mas isso era irrelevante. A missão era apoiar.
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Sabem aquele refrão? Pois bem. Todos viemos apoiar a troco deles lutarem sem parar. Essa era a única conta e a única condição vigente. Sábado pela manhã, inúmeros casos incontestáveis de Palmeiras foram se amontoando sob nossos olhos. Ônibus, caravanas, voos, chegavam amigos de todos os lugares, ilustres desconhecidos que foram se unindo no caminho para o Mané.
Foi lá que notei, pela primeira vez na viagem, que havia um universo para vencermos: éramos minoria. Enquanto a gente trocava abraços aguerridos, eles pareciam chegar para um evento de entretenimento. Nós somávamos vozes esparsas, mas dedicadas para algumas palavras de ordem. Eles sorriam, comiam nos arredores, tomavam alguns drinks, e a gente preenchia nossa parte na bancada.
Talvez o flamenguista tenha ido a Brasília para ser campeão, e nós fomos para guerrear durante 120 minutos, ou uma semana, se fosse preciso. Nem na tribuna de imprensa o clima era igual. Sem valorizar o perrengue, mas quando me posicionei para trabalhar, a mídia ~ tradicional ~ estava bem instalada, e não havia cadeira pra mim e um ótimo companheiro palmeirense. Não nos foi problema. Ficamos em pé e gritamos gols quando eles relatavam em frios arquivos de word.
Muito antes da bola rolar, o sistema de som do Mané Garrincha destilava um funk reconhecidamente carioca, agradando o lado esquerdo do estádio. No direito, músicas que derivavam apenas da voz já rouca da multidão. Bexigas, balões, faixas, coreografias, estava tudo lá, pra nenhum jogador ver ou câmera filmar. Era um alento à própria esperança. Estávamos enchendo nossos próprios corações com a sensação inconfundível da glória.
Quando o Palmeiras subiu ao gramado, foi a segunda vez que senti a vitória. Meu computador vibrava involuntariamente. Gabriel Menino foi o primeiro a chegar, e não foi coincidência. Mais tarde, já para ouvirmos o hino nacional, com as equipes enfileiradas, um verdadeiro choque para que não nos conhecia. Amigos de imprensa filmavam, surpresos, nosso próprio texto, curto, sincero. Eles não entendem como é o Meu Palmeiras. Vá justificar olhos marejados por uma estrofe de duas palavras.
A primeira vez que os meus ficaram emocionados foi quando surgiu o alviverde imponente. Era lindo. A bola já rolava, um lado do estádio assistia, tal qual um frígido teatro, e outra pulava enlouquecidamente. Não tem como achar algo menos do que poético. Lá embaixo, o gigante jogava bem, até que Zé errou. Gabriel converteu e optou pelo pior erro que alguém pode ter contra nós e os nosso. Nunca ofenda um familiar ou você terá arrumado uma briga contra a qual não poderá lidar.
Deste segundo em diante, foi só mágica. Gabriel Menino, Raphael Veiga, Luiz, Giuliano, Arthur, Alan, João, Abel, todos nós entregamos o que nem sabíamos ter. Com a vitória parcial, a voz deles não durou mais do que 3 minutos, tempo para assimilar o golpe e preparar o contra. O maior craque de finais que já conheci – tenho 28 anos – começou a mudar a história. Tinha que ser ele. Foi em sua comemoração que senti pela terceira vez que seria uma vitória. Encarar, beber a água lançada, peitar. Veiga foi muito nóis. De uma forma memorável.
Gabriel fez o mesmo. Dedo nas têmporas, punho cerrado. Concentração e gana. Calma e guerra. Palmeiras e Palmeiras. Bancada e campo. Uma simbiose que costuma ser invencível. Com essa mistura de nossas duas faces, fizemos Montevidéu, fizemos Maracanã, fizemos Allianz Parque. Fizemos os maiores capítulos do maior campeão que esse país já viu, e segue vendo. Não havia um sujeito qualquer lá, ou pelo mundo, que não tenha se enfurecido por vencer.
Golpes duros com os gols de Gabriel e Pedro, e a arquibancada resistia, cantava mais. Se o jogo ficava pior, cantávamos mais, mais alto, mais forte. Nunca vou me esquecer de vê-los empolgados com uma bola lançada em profundidade, mal dominada por Pedro; enquanto nós quase invadimos o campo por um carrinho de Endrick e uma rifada de Marcos Rocha que mandou a bola no Congresso Nacional.
Somos apaixonados pelo percurso, pelas pequenas vitórias, pelo fascinante impulso de sentir que no campo existem pessoas que estão na mesma sintonia doentia que nós. A gente comemora menos o apito final do que uma dividia vencida e o berro que arroxeia as bochechas. Sabe quando alguém cerra os punhos e celebra com os braços? Isso faz implodir uma arquibancada de palmeirenses. Nem tempestade faz ventar mais que nossa alma de torcida.
Fenômeno natural que deve ter influenciado no blip digno de Avenger que sofrer o lado rubro-negro da arquibancada, desaparecidos como mágica após o apito final. Aplaudir seu elenco? Eles não parecem conhecer essa gratidão que nos pauta. Sabe porque? Certamente existem pouquíssimos grupos que cantam as músicas da torcida quando celebram uma taça. Funk? Eles entoam o recebimento que nós fazemos quando eles vão jogar. Tem como comparar? Falta algum talento cá ou lá? Falta. Entrega? Nunca.
Somos testemunhas de um Palmeiras que não vai perder, ele só pode, talvez, ser derrotado. Existem mais talentosos? Muitos. Mais bem preparados? Focados? Apaixonados? Não tem. E você sabe de quem eu tô falando? Não importa se esse parágrafo se refere ao torcedor ou ao elenco, eles agem com a mesma filosofia, são complemente doentes pelo processo, pelos reencontros, pelos prélios impossíveis. Vencer é só consequência.
Viver Brasília foi um presente. Um revival para quem esteve no Uruguai, um debute para quem conheceu essa sensação pela primeira vez. Ser minoria, ser zebra, ser o improvável. Ser Palmeiras é tudo isso, mas acima de qualquer coisa, ser Palmeiras é ser parte fundamental em uma história que está marcada na pele e na alma pela vitória.
Nós fomos. Nós fizemos. Nós vencemos.
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