Palestra, Tarantino e os EUA

Se fosse filme, não seria tão bem roteirizado

Os Estados Unidos da América precisam de inimigos e, para isso, criam demônios. Rivais a serem perseguidos por um suposto motivo plausível que viabilize e valide ações bruscas de dominação e controle. Estabelece uma “Guerra ao Crime” em que ele, como país e centro de comando, crie uma aura de justiça e receba o selo da invisibilidade para agir. Forja a defesa que ataca livremente.

Cresce. Doutrina e retira o foco. Spotlight, o filme, por exemplo. Toma a fonte de luz e direciona ao seu gosto para que lhe sobre a sombra, lugar confortável que disfarça erros, que penumbra dificuldades, que abre caminho para sobreviver. Dá comida aos leões, mas a carne é a dos outros, é claro. Bode expiatório, um boi de piranha.

O torcedor foi o boi de piranha.

O Palmeiras é um clube de convicções, de fé, de irredutibilidade. O fracasso e a glória fazem parte da história dele, mas o modus operandi faz parte da essência. É 100%. É política. É ame ou deixe-o. É meticuloso. Observa e controla o que o cerca e se prepara para a ação. Se as nuvens se atentarem ao amontoamento e a tempestade se avizinhar, que se molhem os outros. Custe o que custar.

O Palmeiras não era esse paladino do mal. Era mais democracia, era mais amável, era mais próximo, era mais carinho. O Palmeiras era ligado com os seus. Não à toa, quando deu errado, ele teve essa gente ao lado. Do gigante concreto novo, mas do velho e chuvoso municipal em dia de série B.

Endeavour.
Foi amor.
Foi amizade.
Parece o Estado Islâmico.

Existe uma linha de raciocínio nesse momento. Do lado de cá, meia dúzia perde a mão. Do lado de lá, criam demônios para unir o seu povo em prol de um bem maior. Descaracterizam uma situação e reconstroem a narrativa ao seu favor. Uma habilidade rara de fazer do factoide o fato. É como se fosse possível parar o tempo e remontar a cena. Tarantinizar a vida.

A conquista do estadual foi a caixa maldita de Seven, aquele outro filme.

Aliás, foi a caixa de pandora ao contrário. A conquista expôs os problemas e abriu cicatrizes. Parece, então, que a solução foi cegar. Ignorar. Fazer com que a caixa nunca fosse aberta. Fazer com que existisse um inimigo na hora de matar o inocente. É como usar um pó de pirilimpimpim e fingir que há paz. É o happy end às avessas.

O Palmeiras construiu a cena. Os Estados Unidos sempre fizeram. O cinema repete os dois primeiros. A vida não costuma se repetir nas histórias, mas é certo que mais uma Guerra ao Crime está em plena atividade.