Uma noite de Libertadores
O Palmeiras passou ao passado naquela noite há 13 anos. Voltou ao futuro que seria muito melhor, muito mais Palmeiras, a partir de 2015.
Uma das maiores vitórias de um dos menores times do Palmeiras. Mas um dos mais verdes times que já vi em 47 anos de Palmeiras e de Pacaembu. De Porcoembu. O Palmeiras ainda estava longe de ser campeão. Mas não estava distante de voltar a ser Palmeiras.
Uma das maiores celebrações que senti apenas por uma classificação para a próxima fase de uma Libertadores que poucos esperavam pela fragilidade de elenco limitado. Sem quatro titulares. Sem quatro atletas não inscritos.
Sem 11 disponíveis.
Mas com uma torcida que jogou no 35.000-4-2-3-1. Com a infantil expulsão de Wesley, aos 16 do segundo tempo, um 35.010-0-0. Ou muito melhor: Os 16 milhões de palmeirenses tirando com os pés de Prass um gol certo do bom e catimbeiro time paraguaio, aos 31 finais. Quando milhares cantando o Hino verde no meio da pressão paraguaia oravam por milhões vigilantes pelo mundo.
Com a confiança que o imenso espírito de porco, periquito e Palestra que permeou o Pacaembu na quinta-feira de resgate do torcedor. O Palmeiras não passou apenas de fase em um torneio onde não iria mesmo longe. Fez um ritual de passagem para um lugar que parecia perdido.
O Palmeiras passou ao passado naquela noite há 13 anos. Voltou ao futuro que seria muito melhor, muito mais Palmeiras, a partir de 2015. Deu um presente ao torcedor que deu ao time limitado vida. Velocidade com Vinicius – o nome do jogo, quem diria. Vitalidade com Mauricio Ramos – que partida. Vida com uma equipe que se doou. Se doeu. Deixou de ser danada e acendeu uma vela na escuridão daqueles últimos tempos do Palestra.
O time que perdeu um gol fácil com Juninho por ele ser lateral, não centroavante, a um minuto do segundo tempo. Que quase fez um gol de calcanhar com Marcelo Oliveira que não é artilheiro, aos três. Que quase fez outro com Márcio Araújo que não é de frente, aos quatro. Que fez um gol de sorte num chute torto de Wesley com desvio para o pé ruim de Charles, aos oito do segundo tempo.
O Charles Anjo 28, sugere o colega Alexandre Petillo. O Charles do gol que o Calabar, o Cecchini, o Zuccari, o Alemão, o Paulo Sapo e tantos chutaram junto. Junto com a zica.
Sorte que o Palmeiras não sabia o que era desde quando fazia as coisas direito. Sorte de cada palmeirense que ficou com lágrimas nos olhos. Ou molhando o teclado.
Não vou contar quem fui.
Desde a derrota para o Goiás, na Sul-Americana, no Pacaembu, em 2010, o que se via era o palmeirense macambúzio. Com aquela sensação de que daria tudo errado. E dava. E não dava mais para nada.
Quando Wesley foi expulso, quando o time mais estruturado, mais entrosado, menos desfalcado do Libertad veio pra frente, pra cima do Palmeiras, não houve mais aquela sensação de que vai dar tudo errado daqueles últimos anos antes de 2013. De que não tem mais jeito. De que não tem mais Palestra.
A emoção que o palmeirense viveu foi de felicidade. Não de tensão. Ele sabia que, desta vez, a bola deles não iria entrar mesmo com a pressão. Não teria gol de Vagner Love para rebaixar o time no final como em 2012. Não teria gol no fim do Fred para dar título brasileiro ao rival. Não teria os adversários ficando até com dó de zoar. Não teria mais depressão.
Tinha Palmeiras com um time limitado sendo defendido por uma paixão ilimitada. Tinha Palmeiras em noite de Pacaembu e Palestra.
A mesma emoção que havia sentido havia 40 anos quando vim a este estádio pela primeira vez com meu pai senti agora na primeira grande vitória sem meu pai ao meu lado. Era hoje o jogo para ligar berrando para ele na hora do gol que José Silvério narrou ao meu lado, na transmissão na cabine da Rádio Bandeirantes. Era o jogo para mandar torpedo para meus filhos com um G e 1993 letras O na hora do gol.
Mas a transmissão em HD no Pacaembu travava o sinal do celular. A minha operadora operava mal nesta região. Torpedo e whatsApp não funcionavam com a rede wi-fi bugada.
Eu não tinha como me conectar com minha noiva com quem me casaria um mês depois. Com minha Silvana triste por não conseguir vir ao Pacaembu. Ela que só tinha visto um jogo no estádio quando o futuro sogro dela foi homenageado pelo Santos e pelo Palmeiras na Vila Belmiro, na semana em que morreu, em 2012. Ela que veio ao Pacaembu na despedida e no amém de São Marcos, na semana seguinte.
Ela que queria ver o Palmeiras sendo Palmeiras naquela noite. Mas que não pôde. Ela trabalhava. Eu estava trabalhando. Não pude trazer meus Luca e Gabriel ao estádio. Não pude levar minha nova filhota Manoela ao Pacaembu. Não pude me conectar com meus amores com a bola rolando e os palmeirenses ralando.
Mas nosso amor nos fez estar unidos. Juntos. Conectados pelo amor, não pela tecnologia.
Como aquele cara lá de cima que me fez palmeirense.
Aquele pai que, então, e sempre, deve estar conversando com Waldemar Fiúme, Junqueira, Romeu, Heitor e tantos palestrinos. Celebrando como o Palmeiras foi palmeirense em 2013. Ainda que já se soubesse que não iria longe na Libertadores, ele voltou fundo no carinho. No respeito.
Tanta festa e emoção por uma vitória apertada contra um time paraguaio na fase de grupo da Libertadores?
Sim. Como tenho milhões de emoções por um sorriso dos meus filhos, por um beijo da minha Sil.
Amor é isso.
Infelizmente, quem não ama não sabe.
Obrigado, Babbo, por ter colocado o Charles dentro da área naquela bola.
Obrigado, Babbo, por te me ajudado a ser jornalista há 33 anos.
Obrigado, Babbo, mais que tudo, por te me ensinado a amar.
Por ter me ensinado Palmeiras.
E obrigado por, naquela tarde, 16h37, você ter falado pra São Pedro dar uma caprichada nessa imagem de Pacaembu.