2007 e a última vez que meu pai foi ao Palestra

(Foto: Arquivo Pessoal)

Primeiro de agosto de 2007.

Essa foi a última vez que meu pai foi ao Parque Antártica. Palmeiras e Sport jogaram naquele dia. Lembro vagamente de algumas coisas. Fui eu, ele e meu primo, o Raphael. Meu pai comprou uma camisa para cada um. As duas eram do Valdívia, com o número dez. A minha era branca; a do Rapha, verde. Ele estacionou o Gol azul no shopping e foi andando com a gente até o estádio. Rindo o tempo todo. Projetando a partida.

Eu tinha um ritual estranho sempre que entrava no antigo Palestra: ficava olhando as traves que Zapata não conseguiu acertar. Ficava imaginando a trajetória da bola até me dar a maior alegria como torcedor. Hoje, quando vou ao Allianz Parque, é meio comum escutar a pergunta: onde é o gol das piscinas? Ou: onde o Zapata cobrou aquele pênalti em 99? Tenho lembranças doces do que foi o Parque.

O estádio não é o mesmo. Nós não somos os mesmos.

Contra o Sport – em 2007 – entramos na numerada e eu fiquei olhando para minha esquerda. Passeei por todo campo, pelo anel que separava a arquibancada do gramado, pelo banco de reservas, pelo distintivo atrás do gol. Assistir uma partida era o grande evento da minha semana. Eu tinha 16 anos.

O jogo começou.

Martinez bateu falta por baixo da barreira. Gol do Palmeiras. Meu pai me abraçou forte.

O Sport empatou. 1×1.

Teve um pênalti para o Sport. O Diego Cavalieri defendeu. Sorri com meu pai e meu primo por dois segundos. Eles desempataram no rebote. 2×1. E esse foi o placar final.

A última vez que meu pai esteve no Palestra terminou com derrota do Palmeiras. Saímos tristes, claro. Mas meu pai sempre arrumava um jeito para diminuir a tristeza: "O Corinthians também perdeu, filho". E falava isso para vários torcedores do nosso time na Rua Turiassu: "Menos mal que o Corinthians também perdeu."

Ele nunca teve raiva de nenhum time. É que – assim – arrumava um jeito de minimizar a dor. Como se dissesse: "A gente perde, filho. Faz parte do jogo."

Eu perdi meu pai um mês e meio depois daquele jogo contra o Sport.

Se soubesse teria abraçado mais forte depois do gol do Martinez. Não teria desgrudado quando o Cavalieri espalmou. Quando o juiz apitou o final da partida.

As despedidas são assim. Elas não avisam. A gente só percebe depois. Percebi que aquele foi o último gol. O último jogo. O último abraço na nossa segunda casa.

Meses depois, quando Vanderlei Luxemburgo foi contratado, meu pai deve ter ficado muito feliz na outra dimensão.

Eu estava no Palestra quando ganhamos de cinco da Ponte Preta em 2008. No mesmo setor. Chorei lembrando dele. Queria que tivesse visto.

Hoje, em 2019, o estádio mudou. Eu mudei. Virei jornalista. Trabalho na rádio que ele escutava. Meu lugar é no estúdio.

E o lugar do Luxemburgo voltou a ser o Palmeiras.

Não exatamente no mesmo campo, mas na mesma casa.

Na casa reformada que meu pai não conheceu.