30 anos com Vagner Bacharel nos defendendo eternamente

Hoje faz 30 anos que o pai de Wagner Júnior morreu. Um erro de avaliação médica não detectou um acidente no trabalho e ele morreu quando o filho tinha cinco anos.
A mãe doou os vários uniformes de trabalho do pai e também os que ele havia trocado com colegas. Júnior ficou sem lembrança material. Só a insuportável saudade do pai.

Um modo de diminuir a distância infinita era vê-lo em ação em gravações de fitas de videocassete. Para minimizar a ausência, o menino de seis anos resolveu escolher em 1991 qual seria o local de trabalho de Vágner pai com o qual ele mais se identificava.

⁃ Depois que meu pai faleceu, eu estava buscando um time pelo qual torcer. Sempre torci pelos clubes onde ele jogou. (E não foram poucos…).

Lá no fundo, sem saber sabendo, Júnior queria se identificar com uma só camisa. Como seu pai como zagueiro e lateral havia jogado por Madureira, Internacional, Joinville, Palmeiras, Botafogo, Guarani e Paraná Clube. Como se fosse sempre um só clube em toda a carreira. Com o mesmo empenho e seriedade em campo. Com o mesmo astral e humor com que chamava todo mundo de “bacharel”. A ponto de ele mesmo virar no Palmeiras O Bacharel. Vágner Bacharel. Com V de vitória. Professor da zaga do Palmeiras de 1983 a 1987. Chegou para a reserva de Nenê Santana. Virou reserva de moral e ídolo em fase de vacas magras e burros gordos no clube.

(Um dos meus maiores ídolos. Um cara que não foi campeão. Mas foi mais capitão e vencedor e palmeirense que muitos de nós).

⁃ Em 1991, um ano depois da morte, com seis anos de idade, para tentar diminuir a saudade do meu pai, eu pegava aquelas fitas cassete e assistia a tudo que estava gravado. Os jogos dele e as matérias de TV. Não tinha Youtube. Era o jeito de eu ter contato com meu pai.

A fita VHS que o pequeno Júnior mais assistiria na vida era uma reportagem do então jovem e sempre craque Tino Marcos, na Rede Globo. Mais de cinco minutos exibidos em 28 de agosto de 1986 – dois dias depois do aniversário de 72 anos do Palestra, um dia depois de uma das maiores vitórias em 103 anos de clube: segunda semifinal do SP-86. Palmeiras 1 x 0 Corinthians no tempo anormal, gol aos 42 finais de Mirandinha (o gol como torcedor que eu mais fiquei sem ar na vida). Na prorrogação, mais dois gols. Um olímpico de Éder. Palmeiras finalista do Paulistão. Uma das maiores partidas da história do clube. Aquela que a torcida gritou “justiça” entre o jogo e a prorrogação depois da péssima arbitragem na primeira semifinal. Quando o primeiro dos tantos erros a favor do rival foi a anulação de um gol legalíssimo do pai do Wagner. Com W de “win” – vencer, em inglês.

⁃ Foi ali, vendo e revendo aquela fita de 1986, que eu aprendi a cantar o hino do Palmeiras. Eu via sempre a reportagem do Globo Esporte não só pelo resultado, pelo show do Mirandinha… Também porque aparecia meu pai puxando o time como capitão e entrando em campo com aquela camisa da Cassino, a patrocinadora então. A matéria acabava com o hino depois da entrevista do meu pai já sem camisa. Eu ouvia e ficava repetindo. Aprendi assim a cantar nosso hino.

Era o Palmeiras mais uma vez aproximando pela vida pai e filho. Um pai que não era Palmeiras na infância. Um filho que perdera o pai com cinco anos e ainda não achara o time que aquela reportagem e aquela vitória deram a ele, aos seis anos.

⁃ Foi ali que eu realmente me identifiquei como palmeirense. E arrumei uma maneira de ficar mais perto do meu pai.

No final da matéria da Globo, um repórter perguntou ao pai de Júnior se ele teria preferência pelo Santos ou pela Inter de Limeira na final do SP-86. Vágner Bacharel respondeu com o mesmo vozeirão que hoje também tem o filho:

⁃ Só tenho preferência pelo título paulista.

Preferência pelo Palmeiras que tão bem defendeu de 1983 a 1987. Foram 260 jogos e muitos 22 gols. Fazendo dupla de zaga espetacular com o mito Luís Pereira. Zaga que evitava e fazia gols em 1983-84. E que Wagner Antunes Júnior não viu jogar. Na véspera do nascimento, o pai venceu o Taquaritinga por 2 a 0, no interior. No jogo seguinte, 3 a 0 na Portuguesa. Sem folga-paternidade. Bacharel jogou todas, pelo SP-84.

O filho do Bacharel ainda procura uma camisa original muito bem suada e usada pelo pai. Quem souber, dê um toque. E, mesmo se você não souber quem tenha alguma de 1986, ou de todos os anos em que Bacharel a honrou, lembre sempre que esse sentimento não tem título. Não tem idade. Nem camisa para usar. Tem família para honrar. Tem berço que não se toca. Tem o amor de um filho pelo pai que não se troca. Tem o amor pelo Palmeiras que os dois construíram mesmo sem conversarem a respeito.

Não precisa. Preciso é o Palmeiras.

Hoje, 30 anos da morte de quem me deu muito orgulho e alegria, e que me fez chorar naquele 20 de abril de 1900, fica a torcida sempre pela família querida e palmeirense que, em 2018, foi ao Allianz Parque ver Edu Dracena marcar de cabeça seu primeiro gol pelo Palmeiras contra o Santos. Um gol muito parecido com os de Bacharel.

Não é mera coincidência. É tudo aquilo que Junior escreveu no Instagram nesta segunda-feira, 30 anos depois: "30 anos que eu tento entender a única certeza que temos na vida…; 30 anos que uma parte do meu coraçao bate por uma saudade; 30 anos que eu me pergunto ‘por quê?; 30 anos que as lágrimas escorrem quando eu ouço uma música que me leva até o senhor; 30 anos que eu ganhei um anjo. Obrigado por ser tão presente em minha vida, nessa ausência de 30 mnos. Fique sempre em paz. Bacharel. Te amo pai!"