Amarcord: Palmeiras 0 x 0 São Paulo, campeão brasileiro de 1973, em 20/2/1974

Foi a primeira final em estádio da minha vida, aos 7 anos. Foi a única que vi com meu pai. (No SP-74 ele não quis ser um dos 20 mil palmeirenses contra 100 mil corintianos. No SP-76 ele apresentava o JORNAL BANDEIRANTES e não conseguiríamos chegar a tempo no Palestra. No BR-78 eu dei pra trás no primeiro jogo decisivo contra o Guarani. Ele fazia o JORNAL NACIONAL e o JORNAL DA GLOBO no SP-86. Sorte dele contra a Inter de Limeira…)

Desde o SP-91 eu já trabalhava em rádio, TV e jornal. Eu estava sempre nas cabines. Ele, algumas vezes nas arquibancadas. Quando tinha coragem de ir. O Palmeiras era a única coisa que o tirava do sério. Ele e todos nós.

A única decisão que vimos juntos (e também com minha mãe e meu irmão) foi a do BR-73. Meu primeiro Choque-Rei. Quarta à noite, mais de 76 mil no Morumbi, o empate era nosso no quadrangular final. Vencemos o Cruzeiro no Mineirão por 1 a 0. Viramos 2 a 1 com gol de Luís Pereira contra o Inter, também no estádio do rival. Bastava o empate. Como no BR-72 contra o Botafogo. Como no SP-72 no Pacaembu contra o mesmo São Paulo.

Ademir dava a Guia da Segunda Academia de Brandão. Ele e Zeca jogaram todos os 40 jogos do time que só levou 13 gols! A melhor média defensiva da história do Brasileirão. Um time que goleava por 1 a 0. Fazia o necessário. E muito melhor que a concorrência.

O Palmeiras chegou ao Morumbi e Osvaldo Brandão abriu o jogo. Ronaldo entraria na ponta-direita no lugar de Edu. César Maluco seria o centroavante. O velho mestre ainda fez questão de fazer algo raro na época: prender a escalação na porta do vestiário, num papel branco escrito por ele mesmo. Aquele time que, salvo essa alteração na ponta, era o que até os adversários conheciam e reconhecem até hoje: Leão, Eurico, Luís Pereira, Alfredo e Zeca; Dudu e Ademir da Guia; Ronaldo no lugar de Edu, Leivinha, César e Nei. A Segunda Academia que era um poema. Rima que era seleção. Com seis convocados por Zagallo para a Copa no meio daquele 1974.

Do baixo dos meus sete anos, no anel intermediário do estádio, mais para a bandeira de escanteio da meta à direita das cabines da TV, eu vi um primeiro tempo de muitas porradas. Até Ademir da Guia rasgou parte da chuteira de Forlán, pai do Diego, e um dos mais violentos e maldosos jogadores da história. O Divino foi diabólico como Forlan, os centrais Paranhos e Arlindo, e o volante Chicão. Quarteto da porrada. Poucos times tiveram tantos jogadores violentos como os quatro. E sem ser necessária tanta violência. Forlan e Chicão sabiam jogar.

O primeiro tempo foi essa pancadaria sanguinária – também do pilhado Palmeiras. Na bola, o campeão brasileiro de 1972 foi melhor. Só não abriu o placar e mesmo o ampliou porque Valdir Peres fez a partida que acabaria o levando para ser o terceiro goleiro do Brasil na Copa-74. Reserva do reserva de Leão.

A segunda etapa foi melhor. O São Paulo resolveu jogar. O Palmeiras, mais ainda. Só não ganhou porque o goleiro tricolor falecido no ano passado foi mais uma vez sensacional. É o que li nos acervos dos jornais agora. É o que lembro daquela noite há 44 anos. É o que não vi no Morumbi. Porque todo ataque do Palmeiras com Ronaldo passando por Gilberto, Leivinha escapando das pancadas de Chicão, Ademir e o não menos genial Pedro Rocha jogando muito, Nei respondendo na bola e a dribles aos padrões e pavores de Forlán (e a zaga verde também baixando o guatambu no ótimo ataque tricolor), tudo que o Verdão criava e chegava ao ataque, eu não via mais nada: a torcida se levantava quando o Palmeiras chegava próximo á área de Valdir. Eu, do baixo dos meus sete anos, também me levantava. Mas não conseguia ver nada. Só as costas de palmeirenses pulando e não vendo também os gols porque Valdir Peres não deixava com uma atuação fantástica. Tipo a do Zetti na Libertadores-94, no Pacaembu.

Aquele 0 x 0 de 27 de abril de 1994 é pra esquecer. Mas esse de 20 de fevereiro de 1974 é pra guardar nós mesmos olhos que só puderam ver as costas de palmeirenses que se levantavam e me tiravam a visão do campo.

Só lembro depois do apito final, a família gritando que era campeã, a festa do time no gramado do rival, a pizza no restaurante Forno, na Joaquim Floriano, com a fumaça dos cigarros que então se permitiam, o vinho que meu pai bebeu com a família, muitos palmeirenses celebrando o que era o bicampeonato nacional seguido ao de 1972.

E eu que não vi gols, e não os teria visto se eles tivessem acontecido pelo meu tamanho, nunca mais vi o Palmeiras ser campeão ao lado do meu pai.

Desde a Copa do Brasil-15, só vejo acima. E vejo cada vez melhor.

PALMEIRAS 0 X 0 SÃO PAULO

Campeonato Brasileiro de 1973 / quadrangular Final – Jogo Decisivo

Quarta-feira, 20 de fevereiro de 1974

Morumbi

Juiz: Arnaldo César Coelho (RJ)

Renda: Cr$ 997 860

Público: 76 549

PALMEIRAS: Leão; Eurico, Luís Pereira, Alfredo e Zeca; Dudu e Ademir da Guia; Ronaldo, Leivinha, César e Nei.

Técnico: Osvaldo Brandão

SÃO PAULO: Valdir Peres; Forlán (Nelsinho), Paranhos, Arlindo e Gilberto; Chicão e Pedro Rocha; Terto, Zé Carlos (Ratinho), Mirandinha e Piau

Técnico: José Poy