Especial BR-72 – Campeão! Palmeiras 0 x 0 Botafogo

O Palmeiras foi campeão paulista invicto de 1972 empatando sem gols o jogo decisivo com o São Paulo, em setembro. O Palmeiras foi campeão brasileiro em 1972 (perdendo apenas 4 jogos) empatando sem gols com o Botafogo, no Morumbi. O melhor time do campeonato foi também o melhor na partida única.

O Botafogo do treinador Leônidas não teve o goleiro Wendel, lesionado na clavícula esquerda. Cao, goleiro do clube que perdeu o último jogo do Robertão de 1969 para o Palmeiras, foi o titular. Jairzinho não estava 100%, assim como o palmeirense Dudu, com problemas no joelho.

Antes de a bola rolar no sábado à tarde, antevéspera do Natal, a polêmica começou desde a escolha do Morumbi. Apesar de o Palmeiras ter o mando de campo, o clássico ser disputado no estádio do São Paulo foi determinação da CBD. Oswaldo Brandão não gostou. "Antonio do Passo [diretor] manda na entidade. Os cariocas mandam no futebol brasileiro e fazem o que querem. Por isso escolheram o estádio do São Paulo e não o Pacaembu".

O treinador palmeirense também criticou os cartolas paulistas. "A FPF aceita tudo que vem da CBD e não faz nada".

A metralhadora de Brandão também chegava às arbitragens. Até para defender o Corinthians, eliminado na semifinal do BR-72 pelo Botafogo. "Têm muitas coincidências a favor do futebol carioca… No Maracanã, [na outra semifinal], o Sebastião Rufino não deu um pênalti claro no Sicupira [Corinthians], não marcou falta no Ado no gol da virada do Botafogo [NR: aqui não houve nada], e ainda anulou outro lance de gol legal do Corinthians".

Brandão queria Armando Marques no apito. O árbitro que o Botafogo não queria pintado de preto e branco. (E que teria má atuação na partida entre Palmeiras e Botafogo da Libertadores-73, quando mais uma vez prejudicou o time de Brandão…).

Agomar Martins foi o escolhido pela CBD. Sem a aprovação do treinador: "ano passado ele apitou muito mal um jogo nosso contra o mesmo Botafogo".

As críticas do velho mestre sobravam até para o palmeirense: "nossa torcida é fria e desinteressada. Para piorar, o jogo sábado vai pegar as lojas abertas para as compras de Natal. Seria melhor para o público e para a renda que fosse à noite".

O elenco palmeirense estava confiante. Mas atento. "Não podemos nos desesperar como no jogo contra o São Paulo quando levamos um gol e nos desorganizamos", disse o jovem craque Luís Pereira. "Mas vai dar pra ganhar".

"A derrota pro São Paulo nos abriu os olhos", disse Madurga.

Ademir da Guia também preferia o Pacaembu. "O gramado está pior do que o do Morumbi, mas nós o conhecemos melhor".

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Nei era outro que sabia que o empate bastaria. "Estou melhorando. Perdi 2 kg. Fiz o gol da classificação contra o Inter depois de perder muitos gols nos últimos jogos. Ainda estou apanhando muito dos zagueiros, mas já sei como aguentar as pancadas".

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O treinador Leônidas do Botafogo sabia sabia da força do rival, que desde 1964 não era vencido pelo clube carioca: "Palmeiras chega a irritar o adversário de como esse time sabe ficar com a bola".

O DIA DO JOGO

Clovis Rossi, escrevendo em O ESTADO DE S.PAULO, 40 anos antes de trocar o Nosso Palmeiras pelo Barcelona dele, já fazia as dele dizendo que seria muito melhor para o torneio uma final entre Palmeiras x Corinthians. E que por isso o clima não era de decisão na cidade…

Mas era preciso conter o ambiente festivo no elenco. Raul Marcel, goleiro reserva, havia se casado na terça-feita antes do empate com o Inter, no Pacaembu. Leivinha, goleador do Palmeiras no BR-72, casou na quinta-feira, com a bandeira do Palmeiras no altar, já classificado para a finalíssima.

A lua de mel seria depois da decisão de sábado, na Europa. História parecida com a de Ademir da Guia, cujas núpcias foram na véspera da conquista da Taça Brasil de 1967, no terceiro jogo contra o Náutico, no Maracanã

O Palmeiras chegava confiante e favorito ao Morumbi. O Botafogo iria a campo com dois meses de salários atrasados. (Seria campeão brasileiro em 1995 com salários atrasados em cinco meses…)

Não vieram tantos botafoguenses a São Paulo. Apesar do "milagre econômico" de 1972, não era barato o transporte. Pela Ponte Aérea custava 128 cruzeiros a passagem. O trem mais barato até São Paulo era 14 cruzeiros. Ônibus saía por 22. Ainda assim chegaram 64 ônibus cariocas.

Não era fácil chegar à época ao afastado Morumbi. No sábado à tarde, 23 de dezembro, mais difícil ainda. O Palmeiras queria jogo 21h, com o comércio ja fechado das últimas compras natalinas. Mas não houve jogo para a CBD.

Para piorar, choveu muito forte a partir das 14h. Chuva que não parou até 15h30. O que fez com que arbitragem e CBD, com anuência dos clubes, adiassem o pontapé inicial em meia hora. E ainda assim teve gente chegando depois do primeiro apito do árbitro.

Como acontecia até os anos 1980, o atraso inicial foi ainda maior. O Palmeiras só veio a campo 16h35. O Botafogo faria pior: 16h45. O time palmeirense ficou na chuva se aquecendo com o excelente preparador Hélio Maffia. Ele não deixava os atletas darem entrevistas naqueles 10 minutos para não perderem o aquecimento.

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O time carioca entrou vaiado também pelo atraso de mais de 15 minutos. As equipes então se perfilaram e ouviram o Hino Brasileiro, ainda não obrigatório nos estádios.

PRIMEIRO TEMPO

Com 50 minutos de atraso a bola rolou. O Palmeiras foi sempre melhor, administrando com inteligência e eficiência o empate que lhe dava o título pela melhor campanha na primeira fase do BR-72.

A primeira chance foi paulista. Ademir da Guia lançou Madurga que passou por Osmar (zagueiro da seleção olímpica) e chutou fora, aos 8 minutos. Aos 16, Brito (campeão do mundo pelo Brasil em 1970) salvou gol de Leivinha.

O camisa 8 e artilheiro palmeirense no BR-72 teria outra boa chance aos 32 (já com os refletores acesos desde os 25 minutos). Aos 34, ele marcou um gol, mas o lance foi anulado por impedimento de Nei.

O time carioca não conseguiu chegar à meta de Leão. Os laterais Eurico e Zeca não deram espaço para os pontas Zequinha e Ademir.
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Luís Pereira foi perfeito por cima e por baixo.

Dudu também anulou Jairzinho. Ademir da Guia foi o melhor da primeira etapa, armando e cadenciando o jogo, e também dando um pé a Dudu. Madurga e Edu (também porque orientado a acompanhar o apoio de Marinho Chagas) não foram tão bem. Nei voltou a jogar demais, driblando muito e passando várias vezes por Valtencir.

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INTERVALO

No intervalo, o torcedor José Lazarini Filho passou mal e morreu de infarto, aos 73 anos. Foi atendido no ambulatório do Morumbi.

O ex-diretor Arnaldo Tirone (pai do futuro presidente do clube) também não passou bem e foi para casa, desaconselhado a ouvir a decisão pelo rádio.

O repórter de televisão Gilberto Pereira levou um choque com o microfone e desmaiou, mas voltaria para trabalhar na segunda etapa.

SEGUNDO TEMPO

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Leônidas substituiu Ademir pelo centroavante grandalhão Ferreti. O Lobo Fischer saiu da área e foi atacar pela esquerda.

Brandão mexeu taticamente no Palmeiras. Aproximou Leivinha mais do ataque e segurou mais Madurga.

A mexida carioca criou a única chance do Botafogo na decisão. Aos 2 minutos, Zequinha enfim passou por Zeca e cruzou para Fischer chutar e Leão fazer ótima defesa.

A partida ficou mais equilibrada. E dura. Aos 12, Jairzinho deu uma entrada dura em Alfredo que caiu desacordado. Mas logo estaria de volta à zaga.

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Aos 15, Nei passou mais uma vez por Valtencir e chutou na rede lateral da meta de Cao. Brandão então mexeu no time. Ronaldo na direita no lugar de Edu para prender mais a bola. Logo depois saiu Dudu, que voltou a sentir o joelho. Zé Carlos entrou mais uma vez bem na cabeça da área.

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Aos 30, o Botafogo forçou mais. Zequinha foi para a esquerda e Fischer passou a atuar na ponta-direita. Deu na mesma. "Eu tinha certeza do título já no intervalo. Do jeito que o Palmeiras jogava e não deixava o adversário jogar, estava tudo bem encaminhado", lembra Leivinha.

O Palmeiras teve menos chances até o final. O Botafogo, nenhuma.

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Zero a zero. O melhor time do BR-72 era o campeão.

MAIS UMA FESTA

Os jogadores estavam tão felizes quanto aliviados no final. "Estávamos mortos", diz Ademir da Guia, que recebeu ainda no gramado uma coroa de "rei do Parque Antarctica", dada por um médico palmeirense. "Mas merecemos tudo isso. Ganhamos os jogos que precisávamos e empatamos quando foi necessário. Só um grande time ganha os cinco torneios que disputa como nós fizemos este ano", disse à revista PLACAR.

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Não teve nem volta olímpica no Morumbi. O time queria voltar o quanto antes para casa para a véspera de Natal no dia seguinte. Além da chuva forte que voltou e levou muita gente mais cedo ao vestiário.

"Foi meu melhor ano pelo Palmeiras. Não apenas pelas nossas conquistas. Mas pelo modo como joguei tantas partidas sem lesão. Nossa preparação física foi excelente", disse Ademir, ainda no vestiário festivo.

"Santo da casa não faz milagre", desabafava Alfredo. "Surgi no clube e fiquei três anos sendo emprestado até o Brandão confiar em mim. As mesmas pessoas que me criticavam hoje estão aqui no vestiário me elogiando".

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Luís Pereira, herói da decisão, era dos nais festejados no campo. Sem camisa, com a faixa de campeão no peito oferecida pela Rádio Tupi, dizia que o Palmeiras não deixou o rival atacar.

No vestiário vice-campeão, poucas lamentações. Apenas constatações e elogios ao campeão: "o Palmeiras foi o melhor time do campeonato e merecia mesmo ser campeão", disse Jairzinho, o Furacão da Copa-70. "Seria uma injustiça o Palmeiras perder esta final e também o campeonato". Palavras do treinador alvinegro Leônidas.

Leivinha defendia o futebol da equipe. "Não ganhamos os dois últimos jogos, mas soubemos ter humildade para jogar conforme o regulamento que nos privilegiou pela melhor campanha".

Também por não ter havido volta olímpica, a celebração pelo título nacional pareceu mais fria que a do título paulista invicto de 1972, 4 meses antes. A chuva, o sábado à noite, e as compras natalinas também explicam parte da "frieza".

Na saída do estádio, muitas buzinas pelas avenidas Giovani Gronchi, Morumbi, Oscar Americano, Rebouças e Nove de Julho. A Rua Augusta parou. Também pelas compras natalinas.

No clube, como de costume, sistema de som do estádio tocando o hino do clube. Chope à vontade. César Maluco de terno branco comandando a festa com a bateria da escola de samba Camisa Verde e Branco.

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A única preocupação da diretoria era renovar o contrato de Brandão, que vencera na véspera da decisão. Como parecia que tudo já estava definido antes mesmo de a bola rolar. O Palmeiras teve 10 pontos a mais do que o vice Botafogo. O semifinalista Inter ficou a 3 pontos do campeão.

A taça de 1m30 e 12kg da CBF ficou para o Palmeiras, oferecida por Magalhães Pinto, ex-governador mineiro, e torcedor do clube.

O Internacional pediu a anulação do jogo semifinal por entender que Ademir da Guia estava impedido no gol de empate. O processo no STJD deu em nada.

A CBD consultou Palmeiras e Botafogo se os clubes queriam participar da então deficitária Libertadores da América.

Os dois representariam o Brasil no torneio em 1973.

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PALMEIRAS 0 X 0 BOTAFOGO
Campeonato Brasileiro/Final — Jogo Único
Sábado, 23/dezembro (tarde)
Morumbi
São Paulo (SP)
Juiz: Agomar Martins (RS)
Renda: Cr$ 649 445
Público: 58 287
PALMEIRAS: Leão; Eurico, Luís Pereira, Alfredo e Zeca; Dudu (Zé Carlos) e Ademir da Guia; Edu (Ronaldo), Madurga, Leivinha e Nei
Técnico: Oswaldo Brandão
BOTAFOGO: Cao; Valtencir, Brito, Osmar e Marinho Chagas; Nei Conceição e Carlos Roberto; Zequinha, Jairzinho, Fischer e Ademir (Ferretti)
Técnico: Sebastião Leônidas