Foco no G4? Não. Foco no Mateus

O discurso do Palmeiras na reta final de Campeonato Brasileiro é curto e grosso: “Foco no G4”. Mesmo antes do confronto contra o Corinthians, quando poderia deixar a diferença para o líder em dois pontos, o discurso foi mantido, embora o foco fosse o título. O objetivo era tentar amenizar a pressão externa por resultados, devido ao grande investimento que fez do clube, em 2017, o grande favorito para todas competições que disputasse.

O falso foco ficou tão escancarado que até a torcida passou a repetir a frase nas redes sociais em tom de brincadeira. O foco do Palmeiras não deveria estar no G4, no título e muito menos em tentar aliviar a pressão. Principalmente agora, o foco do Palmeiras deve estar no Mateus.

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Mateus Bruno da Silva, de 30 anos, é um dos milhões de apaixonados pelo Palmeiras. Nascido em Cuiabá, no Mato Grosso, é filho de pai de santista e neto de avô palestrino. O papai Valter da Silva apoiava a decisão de Mateus, afinal, só era santista por conta de seu avô. Enquanto criança, Mateus sempre acompanhava o time de coração pela televisão. Aos 12 anos, viveu em sua casa uma das maiores emoções da história do clube e também de sua vida.

Como torcedor, ganhou a Copa Libertadores da América. Como filho, ganhou a promessa do pai, em meio a olhos marejados, de que juntaria dinheiro para levá-lo conhecer o famoso Palestra Itália. Dois anos depois, sem ter conseguido cumprir sua promessa, Valter da Silva foi torcer pelo Santos, pelo Palmeiras e pelo seu filho das arquibancadas do céu. Mateus não se abalou. O garoto prometeu a si mesmo que cumpriria pelo seu pai a promessa recebida.

Longe do Palestra Itália, veio a estreia em São Paulo

Foto: Arquivo Pessoal

14 anos depois, em 2013, Mateus completou 25 anos e parte do desejo de seu pai. No dia 24 de fevereiro, estreou em um jogo do Palmeiras junto com o atacante Leandro, na vitória por 1 a 0 diante da União Barbarense, no Pacaembu. Ainda não era hora de conhecer o Palestra Itália, mas ele não ligava. Sabia que não aquela não seria a única vez que viajaria para assistir ao Palmeiras. O importante era estar ali, experimentando seu time de perto.

Decepção em seu 2º jogo? Não para Mateus

Foto: Arquivo Pessoal

Ainda em 2013, Mateus marcaria presença em um dos mais importantes jogos da temporada. Em maio, ele voltaria ao Pacaembu para acompanhar a derrota do Palmeiras para o Tijuana-MEX, na partida de volta da Libertadores da América, por 2 a 1. A eliminação nas oitavas-de-final da competição não tirou o brilho dos olhos de Mateus. Na manhã seguinte à eliminação, ele foi o único torcedor a comparecer ao CT da Barra Funda levando uma faixa com os seguintes dizeres: “não temos estrelas, mas temos 11 guerreiros”.

Foto: Arquivo Pessoal

Maurício Ramos, então zagueiro da equipe, o colocou dentro da Academia de Futebol para que o elenco pudesse receber o carinho do palmeirense, e permitir ao torcedor tirar algumas fotos com todos os atletas do elenco, inclusive o goleiro Bruno, cuja falha ficou marcada na história.

Foto: Arquivo Pessoal

A equipe acabara de deixar o torneio mais importante do ano com uma derrota dentro de casa, mas ele não ligava. Sabia que não era a última Libertadores da América que o Palmeiras disputaria, nem mesmo a única vez que assistiria a um fracasso do clube. O importante era estar ali, apoiando seus guerreiros.

O quase 3º jogo, a viagem de noivado e uma grande ironia

O calvário da Série B estava chegando ao fim e o Palmeiras receberia a taça na partida diante do Ceará, em casa. Os tempos de solteiro de Mateus também estavam chegando ao fim e sua futura esposa topou fazer a viagem de noivado para São Paulo, pertinho do Palmeiras, onde Mateus se sente em casa. Quatro meses antes da partida, passagens compradas e hotel reservado.

Uma semana antes do jogo, venda de mando confirmada para Campo Grande-MS. Mateus e sua noiva teriam de assistir a entrega da taça pela televisão do hotel, mas ele não ligava. Sabia que poderia visitar o CT e passar seu carinho aos jogadores que viajariam até o Mato Grosso do Sul. E assim o fez. O importante era estar ali, passando sua energia para quem veste a camisa como ele.

Na 3ª partida, o desejo do pai é realizado em um jogo inesquecível

Foto: Arquivo Pessoal

Numa clássica final de Copa do Brasil entre Palmeiras e Santos, dentro do Allianz Parque, Mateus realizou o desejo do pai de assistir a um jogo no Palestra Itália. É claro que a estrutura era totalmente diferente, porém, bairro, local, ambiente e arquibancadas vibrando com a vibração dos vibrantes palmeirenses sempre compuseram o cenário e a experiência. E que experiência! Depois de comemorar o título ao lado do amigo Leandro, também de Cuiabá, ele resolveu abraçar um senhor cujo rosto se afogava em lágrimas nas arquibancadas.

Comovido com a história de Mateus, esse senhor o levou aos vestiários durante a festa do título. Como? Mateus havia encontrado um conselheiro do clube. Mas ele não ligava. Sabia que a festa seria completa mesmo nos arredores da arena. O importante era estar ali, onde seu pai queria vê-lo como em 99.

No 4º confronto, o grito que ele jamais havia soltado

Foto: Arquivo Pessoal

Mateus era pequenino quando César Sampaio levantou a taça do Campeonato Brasileiro de 1994. Era apenas seu sexto ano de vida e ele ainda não entendia o que era futebol. Somente um pouco sobre a Seleção Brasileira. Então, diante da Chapecoense, era a hora de soltar o grito de campeão brasileiro. Em caso de tropeço, o Palmeiras poderia adiar a confirmação do título, mas ele não ligava. Sabia que tinha a chance de viver algo único. O importante era estar ali, assistindo ao time que, naquele dia ou em outro, fatalmente levantaria a taça.

Nesse domingo, será o 5º jogo, agora com foco no G4. Ou melhor, no Mateus

Sob protestos, pichações, pedidos de dispensa e em má fase. O Palmeiras não briga pelo título e vive a possibilidade de enxergar sua vaga direta na próxima Copa Libertadores ameaçada. Ainda assim, Mateus estará presente na porta da Academia de Futebol no próximo sábado, mesmo sabendo do treinamento fechado para jornalistas e convidados. Ele não liga. Sabe que o foco do time, estando no título ou no G4, pouco importa. O importante será estar ali, mostrando seu apoio na Academia de Futebol, e depois no Allianz Parque, repetindo o carinho diante do Flamengo.

Mateus representa o que o elenco do Palmeiras tem de assumir a partir de agora. É vestir a camisa pelo prazer de usá-la. O elenco não deve entrar em campo no próximo domingo para responder críticas, pichações ou comunicados. Além disso, também não deve pensar nos discursos que podem amenizar a pressão externa, seja qual for o resultado final da rodada. Mateus não liga. Por que o elenco deve ligar? O Mateus estará lá para apoiar a camisa que ama, assim como o Palmeiras estará lá para honrar a camisa que veste.

Foco no G4? Não. Foco no Mateus.