João Gabriel: ‘O maior ano da minha vida de Palmeiras’

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Talvez os meus anos de Palmeiras sejam até mais longevos que os de vida, acredito, com fé, que esse amor venha de outros lugares, do além-terra. São 27 por aqui e nunca antes fui tão feliz. E felicidade é aliada à aflição, tensão, medo e todos os sentimentos que não fazem valorizar a parte boa.

2021 começou como uma prorrogação do anterior, um overtime. Jogamos semifinal enquanto cheirava à rabanada de Natal. Ansiávamos a semifinal da America, mais uma vez, mais um ano, mais uma série de frustrações se amontoando como tensão pré-decisão. Será que viveríamos mais um quase? Dia 5 de janeiro parece, ainda, um devaneio.

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Por vezes, me belisquei, de verdade, porque parecia bom demais para ter qualquer ligação com a realidade. Não fazia sentido aquele baile na capital da Argentina. A face surpresa de Muñeco era a mesma da minha. A diferença, no entanto, era que me sentia no paraíso, não no inferno causado por Rony, Luiz e Viña.

Como todo palmeirense decente, não comemorei, não. Fiquei pensando no quarto gol que deixamos de fazer e a falta que faria. Jamais celebrar, sempre desconfiar. No jogo de volta, estive emocionado além da conta, não fui à live como deveria e enchi d’água os olhos na chegada do elenco ao Allianz.

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Sabe presságio? Era aquilo. Soava coisa ruim e em minutos já ficou evidente que seria. No intervalo, com dois gols sofridos, troquei de camiseta. Claro, a culpa era dela. Usei vermelho porque achei que deveria e comecei a conversar com um amigo, que já tinha desligado a televisão e mal conseguia falar. Ficamos trocando mensagens até o apito final, que não vi, até porque já tinha sido tomado pelo desespero.

Quando ouvi, rezei pra agradecer. Chorei minutos mais tarde, já ao vivo para alguns torcedores que nos viam na madrugada. Sonhei com esse jogo durante muitos dias, com plena ciência de que tamanha provação não era à toa. Só consegui pensar na final durante o mês todo. Trabalhei mal, produzi pouco, pensei em duzentos finais ruins e nunca na vitória. Até o dia 29, antes de dormir.

Alguma coisa me fez crer que dava e, assim, fui para o sono. No dia da final, desconectei completamente. O jogo começou e eu não estava vendo. Logo eu, logo nesse dia. Peguei a estrada e fui andar sem rumo. No cair do sol, supus ser quase o fim da partida e fui pra casa. Liguei a televisão aos 80 minutos. O empate me deu calafrios, mas sentei pra ver. O gol de Breno não consigo explicar pra vocês. Só senti.

O jogador Breno Lopes, da SE Palmeiras, comemora a conquista da competição após jogo contra a equipe do Santos FC, em partida final, da Copa Libertadores, no Estádio do Maracanã. (Foto: Cesar Greco)

Escrevi o relato da partida em 5 minutos, um texto horroroso, mas era sobre a conquista da América. Foi inacreditável. Celebrei com meus familiares, ainda de máscara e abraçando o ar. Trabalhei nos especiais e perdi o sono. Quando a delegação encerrou a festa, já com sol, despenquei em choro até dormir. Sono dos justos, depois de uma vida esperando por essa sensação.

Sem tempo para digerir, fomos ao Qatar, mas era missão impossível, sem nenhuma tristeza. Semifinal ruim, disputa pelo terceiro lugar pior. Não liguei. Faria de novo, de novo e quantas vezes fosse necessário. Entendia as circunstâncias disso tudo, era quase natural, e parecia haver, por mais maluco que parecesse, um horizonte apontando que voltaríamos àquela competição.

Tentei tirar férias do meu time, mas eram águas de Março fechando a Copa do Brasil. O calendário é enlouquecedor e todo errático, assim como eu. Te digo que assisti àquela taça em tom contemplativo, porque sentia a vitória. Glória reconhece glória, e eu reconheci aquele encontro como presságio de taça. Era o tetra do tri mais maravilhoso que presenciei.

Dudu comemora gol de 2015, na final da Copa do Brasil (Foto: Cesar Greco/Palmeiras)

Mas e o tri da América? Calma. Teve muito mais ano antes disso. Os dois vices nas duas Copas que não servem para caralho algum. Dois lixos retumbantes que só enchem o saco quando não são vencidos. É sobre isso e, sim, tá tudo bem. Pena que a gente é reclamão e ficou de birrinha pelo pênalti mal batido. O destino tinha outros planos pra esse azar.

O CRB me deixou puto. Mas muito puto. Muito mesmo. Bem como o Paulistãozinho ou Paulistinhão. Nunca é pequeno quando é clássico e isso é um fato. Mas, de novo, o destino tinha planos melhores para nós. Flamengo, Defensa, São Paulo. Algum Deus do futebol fez a listinha e pensou: eles vão ter a redenção um a um, mas eu não esperava que fossem todos em sequência e em 2021. Até sonhei, mas não era minimamente considerável.

O Brasileirão me fez pensar que a sorte tinha se despedido de nós. Achei, por meses, que ‘ainda dava’, mas nunca deu. Era alvinegro, o troféu. A Libertadores, antes obsessão, surgiu como única opção – e que opção! Nesse ponto do ano, a imprensa, da qual sou parte, mas pela qual não nutro extenso afeto, já alcunhava o Verdão de fracasso e Abel de fraude. A verborragia burra de todo dia.

O São Paulo era imbatível na Libertadores. 3 a 0. O Galo estava na final. Modo silencioso no Mineirão e o jogo feio de novo na final, para absoluta histeria no país do futebol que só considera válida uma forma de praticar esse esporte nada exclusivo. O problema era o Malvadão, imbatível, super-poderoso Flamengo, que já era campeão. Imagine achar que dava pro Palmeiras.

O dia 27 eu prefiro não relatar pra vocês porque eu acho que temos memórias vivas demais para depender de um texto. Você sabe o que sentiu, eu sei o que senti. Se isso não é o paraíso, dispenso a necessidade de conhecê-lo, já me faz o cara mais feliz da praça ser palmeirense em 2021. Dormir e acordar palmeirense, sonhar palmeirense e acordar campeão. Todo santo dia.

Tri da América
Tetra da Copa
Deca do País.

Comemorações da SE Palmeiras pela conquista da Copa Libertadores 2021. (Foto: Cesar Greco)

Ao Abel, meu último parágrafo. Dono dos bordões que aderi, dos gestos que fiz, das palestras que dei e da fé que nunca tive em tamanha intensidade. Da confiança que não me era comum, do gosto pela estratégia e pela idolatria que só havia sentido por Luís Felipe Scolari. Eu vivi a era Abel Ferreira e só posso celebrar. Que oportunidade e privilégio.

Vimos estádio reabrir, vimos uma mulher ser eleita presidente, vimos o mundo abaixar a cabeça e baixar o tom para falar de nós. Vimos nossos inimigos caírem, nossas cores exaltadas. Vencemos tudo, todos, até por 4, no estado e no continente. Não há o que fizerem sobre nós. A inveja, que já era verde, é palmeirense.

Te vejo em 2022, Palmeiras. Quem sabe, pro próximo melhor ano da minha vida?

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