JG Falcade: Meu café com o botafoguense

Deixei o Allianz Parque já era tarde, quase sexta-feira. Debaixo de alguma chuva que insistia sobre nós desde o início de Palmeiras e Botafogo. Cansado, nem me dei ao trabalho de assistir ao jogo pelos olhos da televisão. Queria guardar a imagem que meus olhos haviam registrado. A noite havia sido bonita demais para deturpar minha retina com as de uma máquina.

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De manhã, acordei e fui em busca de um café. Na mesa ao meu lado, uma comitiva de torcedores do Botafogo. Meu boné entregava a Palenistridade, bem como a minha falta de disposição em dialogar com eles. Quem diabos tem humor o suficiente para conversar antes das 10 horas da madrugada? Os dias deveriam começar sempre depois do almoço, que fique claro.

Assim que me sentei, um senhor de alguma idade não se aguentou na própria coxinha e me perturbou: ‘que jogo, hein?’. Havia visto sua camisa com o número 7 às costas, referenciando Garrincha. Assenti com a cabeça, e um simpático: ‘é!’, já baixando a cabeça. Ele de imediato insistiu: ‘esse técnico de vocês aí é uma mala..’. Antes que ele seguisse, fiz questão de interpelar aquela ofensa.

Pronto para destruir cada argumento estapafúrdio dele, com certa grosseria, disse: ‘MALA?’, mas ele logo me quebrou com um longo sorriso. Sua intenção era elogiar o quanto o Palmeiras era um time chato de se jogar contra, colocando sobre Abel a ‘culpa’ pelo o que time fez dentro de campo. Começamos, então, a falar com alguma afinidade sobre futebol, paixões e treinadores portugueses.

Contei a ele sobre o quanto me sinto apaixonado pelo que se tornou o caótico Palmeiras. Que aqui nós nunca tivemos uma referência tão dominante quando Abel, que é o nome mais aplaudido no estádio quando as escalações são anunciadas, que é personagem de tatuagens, que é pai de jogadores e ídolo de uma centena de milhares por aí.

Meu novo amigo botafoguense confirmou que a imagem passada pelo portuga, o nosso, a eles é justamente essa. De quem é a figura central e absolutista – no bom sentido, de um projeto de domínio continental. Contou também que o gringo deles carrega uma pressão enorme pelos resultados do conterrâneo, bem como o demitido Paulo Souza e o emparedado Vitor Pereira.

Juntos, falamos sobre como Abel não é o resultado de um processo mágico de fabricar técnicos. Ele é um acontecimento raro. De surgir campeão, de doutrinar a mais chata e exigente das torcidas, de tocar o coração emocionado e intenso do italiano. De transformar um time todo atrapalhado em um projeto de seriedade e focos invejáveis, frios como os europeus, e quentes como os Parmera.

Eu, já no último gole do meu café, na ponta da cadeira para voltar pra casa, falei a ele que me sentia um privilegiado. Que era uma honra trabalhar e torcedor nessa época, de poder levar meus pais pro estádio e ver o que vimos. Ele me disse algo que prefiro usar como última frase desse textinho de pós jogo:

‘O Palmeiras de Abel Ferreira é um sonho que vocês podem viver. Quem me dera ter essa chance algum dia’.

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