Opinião

Mauro Beting: 'O pai que voltou a ser criança'

Como diz o seu pai Matheus. “Você foi picado pela mosca”. Que a gente sabe que de fato é um porco

Deyverson foi o herói do título do Palmeiras contra o Flamengo (Foto: Conmebol/Divulgação)
Deyverson foi o herói do título do Palmeiras contra o Flamengo (Foto: Conmebol/Divulgação)

Miguel, o seu tataravô Gennaro não tomava banho quando o nosso Palestra perdia. Não jantava. Quebrava tudo. Esmurrava o rádio. Batia nas coisas pela casa. Parecia você quando o São Paulo do Igor Gomes fez o pênalti da classificação para as quartas da Copa do Brasil de 2022, há alguns anos. Quando você demorou para dormir. Quando você sabia que seria mais zoado pela derrota pelos colegas da escola do que pela zoeira usual.

Quando você, do baixo dos seus 9 anos, de verdade não sabia muito bem o que era se frustrar, Miguel. Não sabia o que era não ganhar. Perder.

Desde que Deyverson fez o que fez no Centenário em 2021, Miguel, você só sabia o que seu Gennaro e o seu pai Michel nem sempre sentiram. A alegria da vitória.

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Algo que, mesmo sendo campeão do século XX, mesmo torcendo por quem tem mais títulos nacionais, nem sempre eles souberam. Seus avós e seu pai ficaram anos sem títulos, Miguel. Anos rebaixados. Sofrendo. E por isso amadurecendo. E ao mesmo tempo mais verdes. Mais Verdão.

Você ainda estava bicampeão da América em 2022, Miguel. Contra tudo e o vento. Campeão paulista naquele ano com um 4 a 0 contra o mesmo São Paulo e a lógica. Tudo era a favor do Palmeiras. Mesmo que tudo pareça ser contra. Até mesmo a gente mesmo.

Como diz o seu pai Matheus. “Você foi picado pela mosca”. Que a gente sabe que de fato é um porco. Seu pai até se pergunta ainda se vale a pena ele ter ter ensinado tudo isso…

E todos nós sabemos como vale.

Você gritou muito nos 2 a 0 em 12 minutos brilhantes inIciais no Allianz. Xingou o bairro pela janela. Viu o jogo todo como ainda não costumava fazer com seus então 9 aninhos. Mas já nos pênaltis você meio que tinha largado. Até entrar em convulsão com a derrota. Como o Gennaro e o seu pai, queria quebrar tudo. Queria rasgar a camisa. Não queria mais saber de futebol até no dia seguinte acordar e pedir desculpa para o pai.

“Deus não gosta de mim”, falou.

Não, Miguel. Ele te ama como a gente ama o Palmeiras. E a gente ama dizer e sentir tudo isso.

Até o próximo jogo.

Mas isso você já sabe, agora, anos depois. Você já está crescido. Mais maduro de tão mais verde que está aí no futuro.

Com você eu não me preocupo como fiquei no dia seguinte àquela eliminação em 2022. Quando o seu pai me contou por WhatsApp (lembra dele?) a sua história.

Eu de verdade só estou escrevendo isso tudo pra você ler daqui uns 15 anos porque a minha preocupação em julho de 2022 é com a outra criança da sua casa.

O seu pai.

Fala, Matheus: “Foi a primeira vez que eu não quebrei nada em casa depois de uma derrota assim. Não desliguei a TV com raiva. Fumei sim o cigarro que só fumo em dia de jogo. Mas não virei animal. Desta vez mantive a calma depois dos pênaltis. Só fui lembrar de ficar triste de madrugada na noite que não dormi. Quando fui procurar um chá e lembrei que nem beber eu tinha bebido. Eu precisava cuidar do Miguel. Explicar pra ele que essa foi a primeira derrota de muitas na vida. Eu tiver que ser o pai dele”.

Como disse um dos “tios” do Miguel no grupo do zap: “para algo serviu essa eliminação. O Miguel aprendeu o que é o Palmeiras”.

E eu aprendi mais uma vez como a gente precisa estar atento às crianças palmeirenses. Não o Miguel de 9 anos. Mas o Marheus, pai dele.

Tão criança que ainda não aprendeu que ser palmeirense não é ser maduro. É apenas ser verde.

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