O chorão de 2000 e o campeão de 2015

Eu sou Renan Ballarotti. Mais conhecido no Instagram como Renan Balara. Mais reconhecido como o palmeirense chorão da final da Libertadores de 2000.

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O Mauro Beting me pediu pra contar a minha história por áudio, mas não consigo. Me emociono muito ainda com tudo aquilo, e quando revejo os lances daquele dia. Hoje, 18 anos depois, choro como se estivesse lá no Morumbi. Principalmente quando vejo minha imagem moleque chorando copiosamente. Aquilo me mata, porque sei o quanto me dói agora ver o Palmeiras perder aquele título, e fico lembrando a dor que o moleque de 14 anos sentiu na época.

Somos de Curitiba, de uma família descendente de Italianos toda palmeirense. Sou de 1986, peguei muito criança o final da fila, e não lembro muito os títulos de 1993, 1994 e o timaço de 1996, por ser muito jovem.

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Mas 1998 lembro bem o Oséas fazendo o gol espírita contra o Cruzeiro, e 1999 lembro estarmos no Morumbi nas quartas da Libertadores no segundo jogo. E mais ainda ficar muito bravo com meu pai que ousou dizer o quão emocionante seria se fosse a decisão para os pênaltis, mesmo o Palmeiras tendo ganhado a primeira por 2 a 0…

Tomamos um pau do Corinthians na segunda partida. Mas ver Dinei e Vampeta perderem os pênaltis compensou muito naquele Morumbi lotado.

Fomos campeões e meu pai nunca mais ousou nenhuma profecia dessas. Na semifinal de 2000, depois de São Marcos pegar aquele pênalti do Marcelinho, não tínhamos outra opção a não ser ir pra final contra o Boca.

Conseguimos ingresso pra inferior lateral, e fomos em família num micro ônibus pra São Paulo.

Chegando lá, no Morumbi com 80 mil pessoas, vimos a galera que estava atrás do gol invadir, e nos esprememos com todos em cima das cadeiras no nível do campo pra ver o jogo.

O jogo em si foi muito nervoso, e não ofereceu muito.

A frieza do Boca irritava. A espera por um lampejo do meu ídolo Alex matava a gente do coração. O jeito desengonçado do Asprilla irritava. Tudo foi se encaminhando para os pênaltis, que foram ao mesmo tempo um alívio por acabar tudo aquilo e saber que tínhamos São Marcos no gol, e por outro lado, uma angústia sem fim.

Era difícil respirar. Impossível trocar alguma palavra com alguém. Impossível gritar pra incentivar. E os torcedores do Boca berravam sem parar la de cima.

Começadas as cobranças, o Alex guardou. E dali pra frente nada deu certo.

Rogério guardou também quando já achávamos que estava perdido.

E quando veio o Bermudez e bateu, eu já estava chorando. Já sabia que não ia dar mais. Precisávamos de um milagre muito grande.

Serviu apenas pra eu desabar num choro que nunca foi tão forte na minha vida.

O silêncio da nossa torcida atrelado ao grito da torcida deles foi muito doloroso. E eu chorei copiosamente sem saber o que estava por vir.

Fui contido depois na hora de ir embora pelos meus pais, que não aparecem no video, e pelos tios, primos, a família toda.

Lembro um primo meu mais velho falar. “Porra, piá. Ta chorando tanto por quê? Quer aparecer na TV?”

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Isso dentro do estádio. E eu nem conseguia responder.

Saindo do Morumbi, meus pais começam a receber ligações. “Como que está o Renan?”. “O Renan tá bem?”

Então falaram pra eles que eu tinha aparecido na Globo daquela forma. Mas eles não me contaram no momento.

Voltamos pro hotel bem depois, e eis que chegamos lá, e estavam os jogadores do Boca comemorando.

Nem sabíamos que era o mesmo hotel…

Não me ajudou muito, obviamente.

Dormimos, e no outro dia fomos ver um cunhado do meu tio jogar um torneio de futebol em São Paulo. Amador, de chão batido.

Mal sabíamos todos que era num reduto de corintianos. Ao chegar lá, vi tudo aquilo e pensei “fodeu”. Logo hoje vamos ter que aguentar coríntianos aqui.

Naquele momento ainda não sabia nada da repercussão da imagem, até porque quase ninguém tinha celular na época.

Mas ao entrar no lugar, foi assustador, e ao mesmo tempo diferente.

Não teve um deles que tirou sarro. E o relato deles era padrão. Que quando bateram o último pênalti comemoraram, e estavam rindo, como qualquer rival que se preza. Mas que quando me viram, murcharam, e não conseguiram mais. Porque ficaram sentidos. E que mesmo eu sendo palmeirense, eles se colocaram no lugar como torcedores e não conseguiram rir de mim. Ficaram com dó por verem o quão sofrido era o choro. E tipo pararam, e travaram.

Eu não sabia nem o que responder. Nem queria estar lá, mas foi uma reação completamente inesperada, de torcedores comuns rivais que comemoraram muito a derrota palmeirens, e com a razão deles. Assim como comemoro a derrota deles.
Mas ficaram desconcertados, e me consolavam e davam palavras de apoio, de sentidos que ficaram.

Depois disso, pegamos o ônibus de noite pra voltar pra Curitiba. Um micro que alugamos em família pra ir pro jogo.

Paramos num posto quase de madrugada, numa cidade muito pequena, e foi eu descer do ônibus e ver o que me esperava.
Todo mundo naquele “meio do mato” sabia quem eu era, e me abordava. Eu não tinha visto imagem nenhuma ainda.

Mas deu pra ter uma dimensão do que tinha sido aquilo.

Chegando em Curitiba, graças a Deus eu estava de férias no colégio. Senão o bullying seria forte…

Minha mãe mandou um email pra Globo e o Rogério Tavares, atual apresentador do Globo Esporte da RPC fez uma reportagem comigo em casa.

Depois de tudo isso, carrego essa história com muito orgulho na minha vida.

Ver o Felipão ser campeão brasileiro agora com o Palmeiras me emociona muito. Sou muito fã dele.

Lembro aquele time da época com caras como Marcos, Alex, Galeano, Cesar Sampaio, Roque Junior, Argel, Junior, Euller, Arce. E ver esse time agora com os caras atuais levando o Brasileiro e possivelmente ganhando a Libertadores ano que vem. Isso tudo me faz ter muito mais orgulho ainda de ser palmeirense.

Vou agradecer ao meu pai a vida toda por ter me ensinado isso. E quando eu tiver um filho também, vou levar junto com a gente pra esse caminho maravilhoso.

Como foi a Copa do Brasil de 2015.

Após o sofrimento de 2014 de termos que torcer pro Santos pra não cairmos, 2015 começou com muita esperança pra todos nós. A primeira decepção não demorou a vir. Perdemos o Paulista pro Santos, e o medo que tudo fosse por água abaixo aumentou.

E veio a Copa do Brasil pra mudar tudo isso.

Nessa competição, consegui ir apenas ao segundo jogo da semi contra o Fluminense. Fui com meu primo parceiro de Palmeiras desde criança, que estava comigo em 2000 também.

Palmeiras começou massacrando, e achamos que seria tranquilo. Mas o jogo apertou. E de repente quando escapa o ponta direita deles, vejo o Fred escapando sozinho no meio e já prevejo o pior. Ele estava mancando, machucado, e mesmo assim conseguiu se descolar da marcação. Eu sabia que se o cruzamento fosse meia boca o cara ia guardar. E foi o que aconteceu. Foi um banho de água fria terrível que gelou o estádio.

Estádio que viria a gelar de vez quando o Prass fez aquele milagre num chute a queima roupa do mesmo Fred logo depois.

Eu não sei como a gente não morre nesses momentos. O que acontece dentro do nosso corpo é inexplicável. Frio, calor, falta de ar, soluço, quase quebra os dentes. Se torcer pro Palmeiras fosse uma profissão, teríamos que receber adicional de insalubridade.

Depois disso pênaltis, Prass nos salvando novamente e classificação. Uma explosão. Como é bom sair daquele estádio nessas situações. Leve, louco pra tomar uma gelada que não nos deixam tomar lá dentro. Uma sensação indescritível.

Para a final não conseguimos ingressos, e combinamos de assistir à primeira na casa do meu pai e a finalíssima na minha.

É interessante que temos muitos bons momentos no estádio, mas nesses nunca estão todos juntos. Vão sempre 4, 5, 6…

Mas as nossas reuniões em casa são as vezes mais incríveis que as idas ao Allianz.

No primeiro jogo o resultado não deixou a reunião tão animada. Mas o alívio de ver o cara do Santos perder aquele gol no fim nos deixou com a sensação de que estava bom assim, podia ser pior.

Lembro de falar que aquele foi o nosso gol do título na ocasião.

Segundo jogo e seguimos todos pra minha casa. Uns 15, todos parentes de todos os graus de parentesco e idades.

Como é bom um churrascão de família, com todos palmeirenses e em dia de final.

Nesses dias o vizinho já se programa pra ir jantar fora, porque a barulheira vai rolar solta.

A tensão daquele jogo foi inacreditável, e o alívio que os 2 gols do Dudu nos deram se transformou em desespero no gol do Ricardo Oliveira.

Por que tinha que ser ele ainda por cima?

Mas sempre tem que ser do pior jeito pra depois ficar melhor e mais prazeroso.

Fomos para os pênaltis e ninguém conseguia falar. Era uma angústia sem fim.

A tranquilidade gerada com os dois primeiros perdidos pelo Santos, virou pesadelo quando o Rafael Marques perdeu.

É impressionante como a gente se sentia seguro tendo o Prass naquela disputa. Me sentia como na época do São Marcos. A gente sabe que um vai pegar. E pegou.

Quando o Ricardo Oliveira alinhou pra bater eu pensei. É por isso que esse cara fez o gol. Pra perder agora. Nas mãos do Prass, grande rival dele.

E não perdeu por um triz.

Fiquei triste. Queria muito aquilo. Mas logo vejo o Prass alinhando pra bater. E foi mais um daqueles momentos que eu não sei como a gente não morre. Porque ao mesmo tempo pensava “O QUE ESSE CARA TÁ FAZENDO AÍ?” e “SE ELE FIZER VAI SER A COISA MAIS ANIMAL DA HISTÓRIA”.

O coração estava na garganta, saíam berros desesperados de todos os cantos da casa.

VAIII.

FAZZ.

VAMOOOO.

E ele fez. A explosão na minha casa foi algo como nunca vi. Gente caindo no chão abraçado. Subimos na mesa e saiu uma foto indescritível. Eu amo aquela foto. Quero morar nela. Essa foto explica o que é ser Palmeirense. E se ela for tirada em família, em cima da mesa da minha casa, a coisa fica muito melhor.

Como eu amo esse time por me proporcionar momentos como esse. Vou guardar essa imagem para sempre em meu coração. Ela foi o símbolo desse dia maravilhoso na vida do Palmeirense.

Daquele dia em diante sabíamos que muita coisa boa estava por vir. E veio, está vindo. E o melhor ainda virá!