O Palmeiras de Felipão parece cantor sertanejo: ama sofrer

(Foto: Cesar Greco/Agência Palmeiras/Divulgação)

Quando eu digo que deixei de te amaaaaaaaaaaaaaaaar é porque eu te amooooooo. Um estudo do instituto de pesquisa Datamatti descobriu que 71,2% das músicas sertanejas têm traições e amores perdidos como temas centrais. É a chamada dor de corno. Ficar nos botecos, nas praças e nas calçadas se tornou rotina para quem tem tara por estar na pindaíba. A pindaíba também é fonte de inspiração. Muitas vezes o vencedor surge diante da quebradeira. Cansei de ser o seu palhaço, fazer o que sempre fiiiiiiiiiiz. A cena é comum: veias saltadas na garganta, olhos cheios de lágrimas, berrante e um coração triste.

Vim curar a dor desse mal de amor na boate aaaazuuuuul. Verde, no caso do texto de hoje. Felipão parece que faz de propósito. Tem o time muito melhor do que o adversário – infinitamente, no caso de quarta – e recua quando faz um a zero. O Verdão encurralou o Barranquilla nos primeiros minutos até a bola encontrar Scarpa, que fuzilou de esquerda. Depois disso, o Palmeiras virou letra dramática. Sem precisar chorar pelos cantos e lamentar paixões que ficaram pelo caminho. Mas doeu.

Existe a velha expressão “gostar de sofrer”. No futebol é quando o time entra em campo todo retrancado. E fica se segurando pelas beiradas para não tomar gols. A bola vai batendo na quinta e não entra. O meia vira zagueiro. O atacante vira volante. Todo mundo volta e não vai. Pode dar certo, mas eu condeno. Não gosto. Felipão muitas vezes foi campeão assim. Não vai mudar agora.

Não é só Felipão. Vários treinadores brasileiros têm essa mania de defender muito mais do que atacar. Raphael Chiummo criou frase perfeita na semana passada. Perfeita, digamos, para os adeptos da forma covarde de enxergar o futebol: “mais vale um pássaro na mão do que dois voando”. Frase genial e inédita. O passarinho do traído nem sempre encontra o céu e procura o paraíso. Frase brega e piegas essa última que algum dia será copiada por um compositor sertanejo. E vai virar moda. E vai render milhões. Talvez trilhões. E fará homens traídos e mulheres traídas chorarem horrores, desesperados. Buuuuaaaaaa.

O palmeirense acabou sorrindo. Como também sorriu no final de 2018. Mas precisava de tanto espinho nesse bolo de chocolate? Precisava de tanta canela no arroz doce? Se há elenco, se há torcida, se há estádio. Felipão segurou o mísero gol de Scarpa na Colômbia até os últimos segundos. Marcos Rocha ampliou nos acréscimos. E então o sofredor consumidor de música sertaneja – o que se tornou boa parte dos torcedores do futebol brasileiro – tirou o pé de vez da lama. E festejou o maravilhoso resultado.

Diniz, Sampaoli e Renato são os únicos que não dançam diante do ritmo caipira. Preferem a alegria e desprezam a dor. Gostam mais de cinco a quatro do que de um a zero. Enaltecem a bitoca e criticam o adeus. São os verdadeiros românticos. nem sempre ficam com suas amadas, mas fazem a vida ter mais açúcar, mais fritura. A outra classe – Felipão e Carille, sobretudo – vai caminhando e cantando pela longa estrada da vida, tomando chutes e ataques a dar com pau, com adoçantes e saladas não temperadas. Na esperaaaaança de ser campeã, alcançando o primeiro lugaaaaaaaaaaaaar.