Voz Palestrina: Afinal, a quem pertence o quê?
É comum ouvir de torcedores rivais, e numa dissimulação insuspeita, certos comentários depreciativos sobre o Palmeiras, principalmente daquele time cujo muro da sede social, beirando a Marginal Tietê, na altura do viaduto Hely Lopes Meirelles, (sentido Aricanduva), está mais torto que os antigos prédios da baixada santista, e apoiado a caibros em contenção improvisada de madeira, na tentativa de se evitar um novo desabamento.
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No mais das vezes, são apenas discursos de autoridade, sem qualquer base ou fundamentação que o valha.
Cito como referência o ALLIANZ PARQUE, que ontem recebeu a pontapés o fraquíssimo time do Corinthians, e recentemente também foi palco de mais uma final do Alviverde desde a sua inauguração, em 2014, com a conquista da inédita taça em homenagem ao Rei Pelé. Já foram nove, só pelo elenco profissional masculino, com sete canecos levantados; sem contar os campeonatos de pontos corridos. Poderiam ser oito, não fosse a constrangedora atuação do Sr. Marcelo Aparecido Ribeiro de Souza, juiz responsável por uma das maiores aberrações de arbitragem e da já comprovada interferência externa naquela fatídica decisão de campeonato paulista de 2018 que, “coincidentemente”, precedeu a utilização do VAR nas edições posteriores.
O exemplo é válido porque o palmeirense já foi ou será confrontado com a frase — quase sempre tomada de uma tensão interior e leiga: “ESSE ESTÁDIO NÃO É DO PALMEIRAS”.
Mas, sim, já adianto que o bordão é uma falácia. Absolutamente! Explico.
Em 15 de julho de 2010, Palmeiras e WTorre concretizaram um acordo de vontades devidamente instrumentalizado numa Escritura Pública de Constituição de Direito Real de Superfície[1], e anotada em um Cartório de Registro de Imóveis da capital do estado de São Paulo.
Isto significa que o Alviverde concedeu à WTorre, hoje Real Arenas, o direito de desenvolver e implementar uma “reforma” no maior ativo do clube depois de sua torcida; isto é, o estádio de futebol “Palestra Itália”, de modo a adequá-lo para o conceito moderno de arena multiuso. Em contraprestação, e por tempo determinado (2.044), poderá a superficiária utilizá-lo economicamente; ou melhor, terá o direito de “operação” do estádio, principalmente para fins comerciais.
Leia-se, responsável pela reforma nos imóveis onde está instalada a sede e o estádio acima mencionado. A proprietária segue sendo a Sociedade Esportiva Palmeiras!!!
Pois bem. Embora pareça juridicamente confuso, o Palmeiras introduziu em seu meio um modelo de negócio que se provou sustentável na prática; uma unanimidade confessada entre os próprios rivais. Para nenhuma surpresa, o desesperado Santos cobiça um projeto com a WTorre em moldes semelhantes, ainda que o cenário e as condições (externas e internas) para o acordo certamente sejam incomparáveis.
Não por acaso, o Palestra está encravado em uma das áreas mais nobres de São Paulo e isso facilita tudo, inclusive a ratificação e existência desta parceria que tem se mostrado altamente positiva, para ambas as partes.
Em verdade, há ali um verdadeiro microssistema que garante liquidez e o funcionamento quase que diário da arena em uma frequência de causar inveja, desde eventos menores, a shows de grande porte, espaços coworking, sala de troféus, tour, lazer, atrações, restaurante etc.
Mas não somente isso. É preciso considerar que além de manter o poder de utilização do estádio para as suas atividades esportivas, o clube possui também o direito de perceber as receitas advindas da locação da Arena para quaisquer eventos, inclusive jogos de futebol, exploração do estacionamento, locação de lojas, lanchonetes, etc, até o limite de 45%, antes do fim da parceria. Já as receitas advindas de contratos de tributos diretos de locação de cadeiras e camarotes e exploração comercial da imagem da Arena, do nome da Arena ou de setores dela, inclusive com a utilização conjunta do símbolo do Palmeiras, (“naming and image rights”), chegarão até 30%.
Evidente que nem tudo são flores. A possibilidade de utilização do Allianz Parque pela WTorre não raras vezes coincide com alguma data específica de uma partida oficial de futebol pelo clube. O torcedor certamente se lembrará do show da Sandy e Junior, em 2019, que forçou o clube a mandar a partida de volta da Libertadores, contra o Grêmio, no Pacaembu.
Apesar dos pesares, me parece que essa questão está longe de ser um problema incontornável, até porque, o modelo adotado entre as duas partes privilegia e estimula a mediação e a autocomposição sobre eventuais litígios, sem a necessidade de se provocar a todo e qualquer tempo o moroso e muitas vezes ineficiente poder judiciário. Faço referência a figura da cláusula de Conciliação e Arbitragem para resolução de conflitos e que já foi utilizada algumas vezes pelos figurantes da relação negocial em apreço.
Advirta-se, todavia, a perfeita possibilidade de uma das partes mover uma ação judicial, principalmente para fins de execução, sobre o contrato que contenha convenção de arbitragem, haja vista que o juízo arbitral é desprovido de poderes coercitivos. E é com base nisso que o Palmeiras se apega para executar as multas e pagamentos (líquidos, certos e exigíveis) — hoje já fixados em cifras milionárias — dos demonstrativos financeiros anuais que deixaram de ser enviados pela WTorre desde 2017, contendo os valores obtidos pela exploração comercial da Arena.
Sem embargo de fatores pontuais, e acima de qualquer embaraço que eventualmente venha a surgir durante a parceria, sendo, pois, um contrato com prazo determinado, fato é que o concedente, Palmeiras, tão logo terminada a data de concessão, terá novamente o domínio pleno sobre as acessões incorporadas ao bem pela superficiária (WTorre), independentemente de qualquer espécie de indenização (art.1.375, CC/02).
Assim, pertencerão à Sociedade Esportiva Palmeiras além do bem imóvel que nunca deixou de estar sob o seu domínio, tudo o quanto acresça a superficiária ao bem. Aqui se inclui o Parque Antártica, diga-se, “Allianz Parque”, e o direito exclusivo de sua operação.
Perceba, portanto, que o direito de propriedade — que é aquilo de mais amplo de todos os direitos reais, porquanto reúna em seu bojo todos os atos de disposição, tal qual o poder do seu titular de utilizar a coisa, fruir, dispor, reivindicar e até mesmo destruí-la, seja móvel ou imóvel — é diferente na forma e no conteúdo dos direitos reais na coisa alheia, que pelo prenúncio da própria denominação, garantem apenas o direito de gozo e fruição sobre um bem, no caso da Superfície, a transmissão parcial da posse da propriedade imobiliária de outro titular.
O mesmo não se diga para uma certa arena de futebol localizada na outra ponta da linha vermelha do Metrô, já na zona leste de São Paulo.
Ali, sim, não existe direito de propriedade senão o da própria Caixa Econômica Federal, que é a credora e proprietária fiduciária de um estádio superfaturado, financiado e envolto por escândalos de interesse público, intervenções do próprio presidente da República e de uma inadimplência do já conhecido fiduciante, que, aliás, obrigou a instituição bancária a realizar pelo menos três “acordos” na tentativa de algum dia recuperar o prejuízo da fracassada e mal sucedida operação, que já chegou a ser provisionado a zero, na classificação de risco.
Tais considerações nos forçam a presumir que aquele mesmo torcedor que, num orgulho um tanto fátuo e maledicente, caçoa do Allianz Parque, confundindo o direito de propriedade com a posse direta do direito real sobre coisa alheia, se esquece que o próprio time tem apenas a expectativa, na acepção jurídica do termo, de um dia vir a ser titular do domínio de um bem que nunca foi seu, ainda que por caridade política.
Enquanto isso, enganado por uma situação de fato, não percebe que o caixa operacional do seu clube seguirá por muito tempo comprometido com valores de bilheterias, vendas de transmissão de jogos, cessão de jogadores, entre outras garantias impostas por sua credora e verdadeira proprietária (fiduciária), na esperança de amortizar a dívida que já se mostrou quase que impagável.
Na sua cólera contida, é provável que o já sôfrego discurso tenha no âmago de sua alma uma voz clamando por misericórdia de um futuro previsível e, pelo o que se tem notado, nada promissor, mesmo com todas as benesses políticas e marqueteiras que seu time nunca tivera a bondade ou vergonha de esconder.
O Palmeiras, Graças a Deus, vai bem, obrigado, embora haja muito espaço para evoluir, em todos os aspectos. Mas isso fica pra outro dia.
Enquanto houver a falsa esperança de se poder ocultar a realidade dos fatos, o discurso permanecerá. E a resposta para isso é simples: protagonismo, vitórias e títulos.
Pessoas e opiniões vêm e vão. Já a história, uma vez registrada, se impõe estável, com bases sólidas.
O atual (bi)campeão paulista volta a campo neste sábado (15/04) para a primeira partida do Campeonato Brasileiro de 2023.
No (nosso) gramado em que a luta o aguarda!
Redação jurídica NP.
[1] Artigo 1.369 e seguintes do Código Civil Brasileiro.
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